Saudações:

Em homenagem e reverência profunda à minha Mestra de Ordenação e Treinamento, Venerável Shingetsu Coen Osho.
Que seu Corpo-Dharma, seja como um diamante inquebrantável.
Que tenha próspera longevidade e saúde ilimitada.
Que nenhum mal a atinja.
Que todos os seus esforços sejam recompensados.

sábado, 31 de dezembro de 2011


Parte 17.

Neste momento o Bodisatva da Intenção Inesgotável (Akshayamati), com o coração repleto de alegria, entoa estes versos louvando o Bodisatva kanzeon:

“Verdadeiro observar, observar sereno, observar de sabedoria de longo alcance, observar de misericórdia, observar de compaixão. Tanto esperado, tanto esperado!

Pura e serena em radiância. A sabedoria do sol destruindo as escuridões, controlador de tempestades e incêndios, que ilumina todo o mundo. Lei de piedade, tremor do trovão!”

A mente humana possui dois aspectos, o aspecto puro e o impuro. Kanzeon, com seu profundo olhar de misericórdia sabe que esses dois estados mentais estão sempre presentes, se alternando em razão de causas e efeitos dependendo das condições. A mente pura alegrando-se em bons atos, a mente impura manifestando o mal.

Aqueles que não se deixam afetar pela impureza são sábios, eles transcendem o sofrimento e experimentam a felicidade nesta vida. Os outros, enganados pela mente impura e enredados pelo seu próprio karma, sofrem imensamente. Deixam-se levar através dos três reinos inferiores da existência sofrendo incontáveis aflições, tudo porque suas mentes impuras obscurecem a Natureza Budha.
No Sutra da Dez Etapas está escrito:
"No corpo dos mortais reside a natureza Budha que é indestrutível. Como o Sol, sua luz preenche o espaço sem fim. Mas uma vez ocultado pelas nuvens escuras, é como a luz dentro de um jarro, escondido da vista”.

E no Sutra do Nirvana encontramos:
"Todos os mortais têm Natureza-Budha. Mas ela está encoberta pela escuridão. Nossa Natureza-Budha é estar consciente e fazer os outros conscientes. Perceber a consciência é liberação".

E desta raiz de consciência cresce a árvore de todas as virtudes e o fruto da iluminação.
A mente ignorante (que não sabe), com suas infinitas aflições, paixões e desejos, é presa pelos três venenos: ganância, raiva e ignorância. Esses três estados da mente venenosos por si mesmos incluem inúmeros outros sofrimentos, como árvores que têm um único tronco, mas inúmeros galhos e folhas. Cada veneno mental produz tantos outros sofrimentos que o exemplo da árvore nem é uma comparação apropriada.

Kannon com sua capacidade de tudo observar irradia sua benevolência a todos os seres.
Que possamos nos transformar em Kannon, é isso que é tanto esperado, tanto esperado...


“Compaixão maravilhosa, como uma grande nuvem, caindo simultaneamente chuva espiritual como néctar, apagando as chamas da tristeza!”
No Sutra de Lótus da lei Maravilhosa está escrito no capítulo três (metáforas e parábolas).
“Numa certa cidade havia um homem muito rico. Ele estava já entrado em anos e a sua riqueza não tinha medida. Ele possuía muitos terrenos, casas e servos. Sua casa era grande e complexa, mas tinha só uma porta. Muita gente morava na casa.
Subitamente, pegou fogo atingindo toda a casa. Os filhos desse homem rico brincavam no interior da casa. Quando o homem viu as enormes chamas saindo pelas janelas, ficou alarmado e pensou: Eu consigo escapar com segurança por entre a porta em chamas, mas e meus filhos que estão lá dentro brincando. Eles não tem têm noção do perigo e não pensam em tentar escapar!
Eu tenho força no meu corpo e membros, posso embrulhá-los num cobertor e trazê-los para fora. Mas, a casa tem apenas uma porta estreita e pequena.
Os meus filhos são muito novos e estão tão entretidos com suas brincadeiras que correm o risco de morrerem queimados. A casa já está em chamas e eu tenho que salvá-los do fogo!
Tendo pensado isto, começou a chamar pelos filhos: Venham cá para fora depressa!

Mas apesar dos chamamentos do pai, os filhos absorvidos nos seus jogos não lhe deram ouvidos, nem perceberam os riscos da situação.
Então, o homem pensou: A casa está em chamas, se os meus filhos não saírem de imediato, poderão morrer, devo inventar um meio hábil que torne possível às crianças escapar ilesas.
O pai conhecia os vários brinquedos e objetos curiosos de que eles gostavam. Então ele gritou: O tipo de brinquedos de que vocês gostam são raros e difíceis de encontrar. Se não vocês não vierem agora vão se arrepender. Tem carros, puxados por cabras, por veados e por búfalos. Eles estão aqui fora. Venham e podem brincar com eles.
Quando os filhos ouviram o pai falar-lhes desses raros brinquedos, porque essas eram justamente o que eles queriam, ficaram entusiasmados e empurrando-se uns aos outros, saíram precipitadamente da casa em chamas.
Então, o rico homem, vendo que os seus filhos tinham saído sãos e salvos e estavam todos sentados no exterior, livres de perigo, ficou aliviado. Nessa altura cada um dos filhos disse ao pai: Cadê os brinquedos que nos prometeste, os carros de cabras, veados e búfalos.
Então, o homem rico deu a cada um dos seus filhos uma grande carruagem de igual tamanho e qualidade. As carruagens eram altas e espaçosas, ricamente adornadas com sinos e campainhas, decoradas com preciosas jóias. Cordões de jóias e grinaldas de flores pendiam à volta e o interior era acolchoado e com almofadas púrpuras. Cada carruagem era puxada por um búfalo branco, de pele pura e limpa, formoso e forte, capaz de puxar a carruagem suave e firmemente, num andamento rápido como o vento, muitos cocheiros e criados se perfilavam para servir e para guardar a carruagem.

Qual a razão de tudo isto?
A fortuna desse homem rico era ilimitada, ele tinha imensos armazéns abarrotados de mercadorias. No momento do incêndio ele pensou: As minhas posses não têm fim, essas crianças são meus filhos e eu as amo sem nenhuma parcialidade. Tenho incontáveis carruagens adornadas com tesouros. Devo ser equânime e dar uma a cada um dos meus filhos, sem qualquer discriminação. Meus bens são tantos que mesmo que eu desse uma coisa para cada uma das pessoas do meu reino eu não esgotaria as minhas posses.
Nessa altura, cada um dos filhos subiu para a sua carruagem, ganhando o que nunca antes possuíram, algo que excedia quaisquer das suas expectativas.

O que podemos deduzir dessa parábola? Quando o homem rico deu com imparcialidade estas grandes carruagens aos seus filhos, adornadas com raras jóias, foi culpado de falsidade?
Perguntou o Budha.
E Shariputra disse, Não honrado Pelo Mundo. Esse homem rico apenas tornou possível aos seus filhos escapar do perigo do fogo e preservar as suas vidas. Ele não incorreu em falsidade, ao salvar suas vidas eles receberam os presentes. Através de meios hábeis, conseguiram escapar da casa em chamas!

Honrado Pelo Mundo, ainda que o homem rico não lhes tivesse dado qualquer carruagem, ele mesmo assim não seria culpado de falsidade, porque originalmente, sua intenção foi fazer com que seus filhos escapassem. Usar um artifício deste gênero não é falsidade. Ainda mais que ele sabia que sua fortuna era ilimitada e podia sem maiores despesas dar a cada de seus filhos uma grande carruagem.
O Buddha, então, fala para Shariputra:

Muito bem, muito bem. É tal como disseste. Assim é o Budha e seus Bodisatvas. Ele é um pai para o mundo."

Assim funcionam os Budhas e Bodisatvas, eles usam de meios hábeis para trazer o benefício do Dharma para todos, por isso no Sutra é dito que sua Compaixão é maravilhosa e cai sobre todos os seres como as chuvas de uma grande nuvem de néctar espiritual, apagando as chamas da tristeza.



Parte 16.

Por fim, a um nível mais sutil ainda, podemos dizer que cada um dos nossos pensamentos e das nossas reações, pertence a um dos seis mundos.

A cosmologia budista declara que o universo atravessa continuadamente várias etapas, cada uma dessas etapas possui um ciclo de nascimento, desenvolvimento e declínio que dura bilhões de anos. Em cada etapa de nascimento e desenvolvimento existem os seis reinos. O último nível - o reino dos infernos é o mais baixo e desprezível reino. A concepção do inferno budista é diferente da concepção cristã, na medida em que o inferno não é um lugar de permanência eterna nem o renascimento nesse local é o resultado de um castigo divino; os seres que habitam no inferno libertam-se dele assim que o mau karma que os conduziu ali se esgota.

Acima do reino dos infernos encontra-se o dos espíritos ávidos ou fantasmas famintos, que sentem constantemente sede ou fome sem nunca terem estas necessidades saciadas, dizem os sutras que os seres desse nível possuem um estômago enorme e uma boca minúscula.
O quarto reino é o dos animais. Apesar de ser um reino com maiores possibilidades que os outros dois abaixo dele, ainda possuem muito sofrimento, basta ver como sofrem os animais, apesar de alguns deles, por herança kármica terem uma vida bastante tranqüila. O mundo animal é dominado pelo torpor e pela falta de iniciativa, pela ausência de sentido de humor e de inteligência criativa. Quanto à libertação definitiva do sofrimento, um animal não tem essa capacidade, nem possui os meios de desenvolvê-la.

O terceiro reino é o dos seres humanos. É considerado como um reino de nascimento desejável, mas também difícil. A vida enquanto humano é vista como uma via intermédia nesta cosmologia, sendo caracterizado pela alternância das alegrias e dos sofrimentos, o que de acordo com a perspectiva budista favorece a tomada de consciência.

O reino seguinte é o dos Titãs ou dos Semi-Deuses. Os seus habitantes ali nasceram em resultado de ações positivas realizadas com um pequeno sentimento de inveja e competição, por isso vivem eventualmente entram em atrito uns com os outros e com os deuses.

O último reino é o dos deuses, é composto por vários níveis ou residências. Nos níveis mais baixos vivem os seres que devido à prática de bom karma levam uma vida harmoniosa. Os níveis situados mais acima são chamados de "Residências Puras", sendo habitadas pelos seres que se encontram perto de atingir a iluminação e não voltarão a renascer como humanos.

O Sutra em questão diz que todos esses estados negativos da existência serão terminados, bastando que se produza através do corpo (pela ação correta), da boca (pelas palavras que não causam dano) e do pensamento (pela mente vigilante e tranqüila) os méritos necessários.


sábado, 24 de dezembro de 2011


Parte 15.

“Perfeito em poderes sobrenaturais, praticando amplamente com sabedoria e tato.
Nas terras do universo não há um lugar onde não se manifeste”.
Kannon se manifesta em todos os lugares, até porque o conceito de nação pertence ao domínio político, a verdadeira religião se situa além das fronteiras e das nacionalidades. Nascemos num certo país, num certo bairro em razão de nosso karma, mas esse karma não é extático, pode ser alterado.

O mundo não é capitalista, comunista, nem de homens ou mulheres. O universo inclui tudo isso e muito mais. Kannon pode aparecer em qualquer lugar em qualquer situação e no corpo de qualquer um.

Kannon é o Bodisatva que impulsionado por uma universal compaixão atua em todos os lugares desde os mais longínquos até os mais badalados.

Diz o sutra: “...se existirem seres viventes na terra que precisem de alguém sob a forma de um Budha de modo a serem salvos, o Bodhisattva Contemplador dos Sons do Mundo manifesta-se imediatamente no corpo de um Buddha e prega a Lei para eles. (...) Se precisarem de um ouvinte para ser salvo, imediatamente ele se torna um ouvinte e prega a Lei para eles. (...) Se precisarem de um ser celestial para ser salvo, imediatamente ele se torna um ser celestial. Se precisarem de um rei piedoso para ser salvo, imediatamente ele se torna um rei piedoso. Se precisarem de um monge ou de uma monja, de um leigo ou de uma leiga para serem salvos, imediatamente ele se torna um monge ou uma monja, um leigo ou uma leiga e prega a Lei para eles.”.


“Todos os estados negativos da existência, inferno, fantasmas, animais. Sofrimentos de nascimento, velhice, doença e morte. Todos gradativamente serão terminados!”
Quando observamos o nosso comportamento verificamos que temos uma tendência dominante: Uns são coléricos, outros orgulhosos, outros invejosos e assim por diante. Qualquer que seja a emoção dominante, ela envenena a existência. Os "viciados" do desejo não podem entrar num shopping sem se sentirem frustrados, por não possuírem dinheiro suficiente, enquanto que para os "viciados" da agressão o meio ambiente é ameaçador e destrutivo, já para o fofoqueiro se alguém fala baixo está falando dele.

Pela repetição das ações, as tendências reforçam-se e as percepções especializam-se. Ao longo de nossos dias, encontramos pessoas com os quais é difícil a comunicação, embora morem, trabalhem e estudem no mesmo lugar. Às vezes essas diferenças são tão acentuadas que chega-se ao ponto em que qualquer tipo de relacionamento se torna impossível. Nesse ponto o fosso que nos separa é tal que as percepções começam a pertencer a mundos diferentes.
A tradição budista fala de seis mundos. Podemos compreender estes mundos de duas maneiras.

No nível básico são meios ambientes particulares onde seres de karma parecidos se encontram, partilhando, graças à semelhança do seu karma, as mesmas percepções do mundo. Assim, se fosse possível que um semideus se encontrasse acidentalmente no inferno, como esse tipo de ambiente não corresponde à sua ressonância kármica, ele não veria o mesmo que os seres do inferno.
As mesmas percepções partilhadas por pessoas de níveis diferentes não lhes confere um caráter objetivo de realidade. As percepções, deformadas pela força do karma só são verdadeiras para os seres que possuem um karma semelhante e, portanto têm apenas um valor relativo.
Mas, essas percepções não são falsas, aquilo que vemos não é uma miragem no deserto. Para quem as vê e sente, essas percepções são tão reais como o sonho de alguém que dorme.

O budismo distingue dois níveis de realidade, a provisória ou relativa e a absoluta ou definitiva. A realidade absoluta é a visão direta da natureza. É o aqui-e-agora. A verdade relativa, por seu lado, é compreensível pelo intelecto, mas é "provisória" no sentido em que é apenas uma aproximação, apenas um retrato distorcido, assemelhado da realidade.

A primeira compreensão dos seis mundos consiste em vê-los como mundos não visíveis existindo simultaneamente. Os seres renascem nesses mundos em razão de sua herança kármica e das suas afinidades com os outros seres que lá vivem.
O segundo entendimento consiste em associar os seis mundos com as tendências psicológicas dominantes dos seres humanos e a diversidade das circunstâncias da sua vida.


quarta-feira, 21 de dezembro de 2011


Parte 14.

“Se perseguido por bestas ferozes, presas aguçadas e garras apavorantes, pensar no poder de Kannon, instantaneamente ao som de sua voz, eles fogem”.
“Trovões e raios, tempestades e furacões, pensar no poder de Kannon, todos se dispersam”.

O sutra é todo escrito em metáforas, em símbolos. Se entendemos essas metáforas e as utilizamos em nosso dia-a-dia, em nossa experiência cotidiana, perceberemos a profundidade e sutileza do sutra.

Os animais, as bestas ferozes representam os desejos animalescos que surgem e dominam nossa mente. Passamos nossas vidas correndo atrás dos desejos de fama, fortuna, diversão, poder, sexo etc. Somos um poço sem fundo de egoísmo, distantes do objetivo de nossas existências que é manifestar a Natureza Budha em todo o seu esplendor. A maior parte dos seres humanos vive como animais, impulsionado por desejos os mais primitivos.

Quando fazemos zazen, a luz da verdadeira natureza Budha, nos inunda e voltamos a nos converter em seres humanos em toda a sua excelência.

Durante o zazen é comum aparecer esses estados inferiores, não devemos rechaçá-los nem os alimentar, pois uma e outra ação, não passam de mais um desejo, assim fazendo estaremos alimentando a fera para matá-la de fome.

Os trovões, os raios e as tempestades, são a obscuridade mental, a falta de sabedoria a falta de discernimento. A mente sem direção contaminada pela ignorância, pelos apegos, pelos desejos de satisfação rápida é rapidamente capturada e levada de roldão na tempestade, assolada por furações e amedrontada pelos raios e trovões.

Se nos concentramos no som do sutra, ou no suave ritmo das águas correndo de um riacho, ou no sublime som do vento passando entre os ramos de uma árvore, conseguimos soltar a mente da prisão do ego. Sem estar aprisionado, nenhum temor nos assaltará

Diz o verso:
"No vasto céu não existem nuvens,
No pé da montanha feras e tempestades."

Esses são os últimos acidentes relatados no sutra, com a frase: Pensar no poder de Kannon (Nenpi Kannon Riki), terminam as doze dificuldades. Segue o Sutra relatando os poderes transcendentais de Kanzeon:


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011


Parte 13.

“Se for encantado ou envenenado,
Alguém quiser ferir seu corpo,
Pensar no poder de Kannon,
Tudo reverterá à pessoa de origem”.
Graças ao poder do zazen podemos permanecer íntegros a todos os tipos de maldições, bruxarias e sortilégios malignos.
A ganância, a raiva e a ignorância são o passaporte para o sofrimento. Ganância por que quer receber um salário igual ao dos outros, Raiva porque outro ganhou algum prêmio por sua dedicação e você não, ignorância por não perceber que tudo nessa vida acontece através de causas e condições.

Na sociedade moderna o risco de sermos envenenados é muito alto, seja pelos meios de comunicação em massa nas mãos de pessoas inescrupulosas, seja do próprio envenenamento biológico, haja vista a quantidade de produtos químicos colocados em tudo que comemos e bebemos.

Existem os envenenadores profissionais, que trabalham minuciosamente a fim de camuflarem os venenos e apresentar seus produtos de forma agradável, devemos ter muito cuidado na hora de comprar produtos industrializados.

Se fazemos zazen com regularidade, nossa consciência estará sempre alerta e lúcida, podendo distinguir e perceber o que estamos adquirindo.

Bodhidharma (Bodai Daruma) morreu envenenado por dois monges da escola Tendai, esses monges lhe ofereceram chá envenenado, mas dotado de imensa percepção, ele percebeu a maldade, como já havia encontrado um sucessor, entendeu que havia mais necessidade de continuar vivendo, se considerava livre para viver ou morrer a qualquer momento. Aceitou o chá, bebeu, sentou-se em zazen, fechou os olhos e morreu, há quem diga que ele não morreu, mas isso é história para outro texto.


“Se ameaçado por hakshanas malvados,
Dragões venenosos e demônios,
Pensar no poder de Kannon,
Fará com que ninguém possa feri-lo”.
Hakshanas são demônios devoradores de homens, figuras simbólicas que representam as perturbações fundamentais de nossa mente (Bonno em japones). Infinitas são essas perturbações (desvios mentais, ilusões, devaneios etc.).

Mestre Dogen escreveu que não se deve considerar o diabo ou o demônio objetivamente, mas sim de forma subjetiva. O surgimento de um estado demoníaco em uma pessoa é a resultante de uma anormalidade mental, de uma histeria, de um estado patológico e não tem nada a ver com o fato do sujeito estar possuído por um demônio ou coisa parecida.

No budismo esses estados alterados de consciência são mais numerosos do que os descritos na medicina ocidental. Por exemplo, a inveja, o orgulho e a avidez são considerados estados demoníacos que consomem as pessoas, devorando-as internamente.

Se estamos alertas, poderemos perceber o estado em que as pessoas se encontram apenas olhando seu rosto. Olhem com atenção e perceberão pessoas com caras de cavalo, de asnos, de abutres, de onças etc. Olhem as pessoas públicas do nosso país e tirem suas próprias conclusões. Um rosto orgulhoso, ávido, raivoso, decididamente não é o rosto de um Budha.

Em um comum dia de nossas vidas quantos dragões venenosos, quantas feras aterradoras, quantos demônios vemos refletidos nos rostos das pessoas que passam por nossas vidas.

No livro da Abadessa Shundo Aoyama (Para uma pessoa bonita) tem um texto em que ela fala dos rostos que exatamente como no livro “O Retrato de Doriam Gray” refletem tanto a beleza como a feiúra daqueles que tem uma vida de virtudes, exatamente como disse Láo Tse, se referindo ao sábio vrtuoso.

E o seu rosto o que reflete...

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011


Parte 12.

“Se encontrar sofrimento imposto pelas leis,
A vida para ser executada,
Pensar no poder de Kannon,
Faz com que a arma de execução
Se parta em pedaços”.

Este é o sexto acidente. O sofrimento causado pelas leis, pelo judiciário. Quantos de nós já foram prejudicados pelas leis bancárias, devido aos seus altos juros e política de cobranças. Quantos receberam um cartão de crédito sem o terem solicitado. Antigamente o poder imperial era muito forte e indiscutíveis suas decisões, muitos sofriam injustiças.
No sutra, a lei a que se refere representa o Ego que nos governa, que reina soberano sobre nós.

A maioria acredita que possui uma substancia, uma entidade, um Atmam, segundo os Hinduístas, ou uma Alma segundo os cristãos. No budismo existe a palavra Muga – não existe um ego, não há um eu, não tem Atman, não tem Alma alguma. Não somos governados pelo poder de um ser supremo, ao morrer nada levamos, nada deixamos, somente o vir-a-ser continua.

No Sutra do Diamante está escrito:
“Com o conhecimento de minha doutrina, os homens não sucumbirão ao erro de considerar a idéia de uma ego-entidade, uma personalidade, um ser, ou uma individualidade separada. Eles tampouco sucumbirão ao erro de considerar a idéia das coisas como tendo qualidades intrínsecas, nem mesmo de coisas como destituídas de qualidades intrínsecas. E por que assim será? Porque se tais homens se permitissem ter suas mentes presas e apegadas a qualquer coisa, eles estariam considerando a idéia de uma ego-entidade, uma personalidade, um ser, ou uma individualidade separada; e se eles se vissem presos e apegados à noção das coisas como tendo qualidades intrínsecas ou destituídas de qualidades intrínsecas, eles [certamente] estariam considerando a idéia de uma ego-entidade, uma personalidade, um ser, ou uma individualidade separada” A frase Nenpi kannon Riki várias vezes repetida no sutra nos direciona a percebemos a vida como ela é - mutável.

“Se aprisionado, encurralado, acorrentado,
Pernas e braços algemados,
Pensar no poder de Kannon,
O libertará completamente”.

Mais uma vez nos deparamos com a dificuldade de traduzir os matizes dessas palavras.
O verso em Romanji é assim:
Waku Shu kin Ka Sa
Shu Shoku Hi Chu Kai
Nenpi Kannon Riki
Shaku Nen Toku Ge Datsu
Shu kin ka Sa – o corpo preso por uma argola;
Shu Soku Hi Chu Kaimãos e pés atados.

Essas duas frases designam que vivemos presos, atados, algemados, seja por um emprego que detestamos, por morarmos num lugar que não gostamos, uma esposa que nos faz infelizes, uma doença terminal, dificuldades financeiras etc.
A vida dos que estão verdadeiramente algemados é pesada, um pesado fardo a ser carregado dia e noite.
A vida de um monge zen é muito mais leve. Um ditado japonês diz: “o gato, o idiota e o monge zen sempre estão tranqüilos e felizes”

Conheço alguns monges que ainda não conseguiram atravessar o portal do desapego, são orgulhosos de sua condição de senpai (mais antigo), de morar mais perto da Sensei, consideram que por passarem mais tempo com ela, mais merecem. Estar apegado seja ao que for é ruim, é um grilhão que prende aquele que possui o apego. Essas algemas nos afastam da possibilidades, das oportunidades.

Como bem declara o famoso verso:
“O-kesa preto,
Cabeça raspada,
Vida fácil...”

Mesmo que se você possua propriedades, bens móveis e imóveis etc., a mente deve estar livre de apegos, livre de correntes que possam te prender. Não corra atrás da felicidade, a felicidade não tem forma, não possui categorias, todos que a buscam estão de pés e mãos atadas como diz o verso do sutra.

Fazer zazen, estudar e entender os sutras, manter os preceitos, levar uma vida ética, automaticamente nos liberta desses grilhões do ego.

Mas como cortar os desejos...
Afastando-nos das pessoas de vida incorreta, evitando a poluição visual e sonora, comendo e bebendo espartanamente, nos contentando com pouco. Com uma vida mais simples, discutiremos menos, nos aborreceremos menos, defenderemos menos nossos pontos de vista. O cérebro em repouso pode observar a vida, a natureza, os pássaros etc.

Não percam a parte 13.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011


Parte 11.

“Se perseguido por seres ferozes e jogado do Monte do Diamante,
Pensar no poder de Kannon, Fará com que nenhum fio de cabelo seja tocado”.

No Shushogi, texto do mestre Dogen está escrito:
“Repentinamente, ao estarmos de frente para a possibilidade de morrer, governantes, reis, rainhas, ministros e ministras de estado, parentes, servos, companheiras, companheiros, filhos, filhas, jóias raras, não servem para nada. Devemos entrar no campo da morte a sós. Apenas nos acompanha nosso Karma bom ou mau. A lei da causalidade, entretanto, é ao mesmo tempo clara e impessoal. Os que fazem o mal inevitavelmente descendem e os que fazem o bem inevitavelmente ascendem”

Em outro trecho está escrito:
“Compreenda que você só tem esta vida, não duas ou três. Quão lamentável se, infrutiferamente, mantendo pontos de vista falsos, você em vão errar, pensando que não está cometendo nenhum mal, quando de fato o está cometendo. Você não poderá evitar a retribuição kármica de seus atos, mesmo que erroneamente assuma que por não reconhecer sua existência não está sujeito a eles”.

Da mesma maneira que o Monte Sumi, o Monte do Diamante não existe, esse monte indica um lugar alto onde você imagina estar seguro. Um lugar onde as feras da ansiedade, da depressão, da síndrome do pânico, do estresse repetido, da mania de perseguição, das fobias sociais não consigam chegar. Esses seres ferozes representam as dificuldades que passamos quando estamos desequilibrados, a sensação e de que o mundo está tomado de inimigos que tentam a todo custo nos fazer mal.
Pensar no poder de kannon. Se transformar em Kannon é o mesmo que estar equilibrado, olhando o mundo como ele realmente é – Maravilhoso e perfeito.

“Se encontrar loucos com espadas querendo feri-lo, pensar no poder de Kannon.
Todos os seres insanos se dirigirão à bondade”.

É importante saber que os kanji com o qual foi escrito esse sutra, não possuem um só significado, traduzi-lo para uma língua ocidental é difícil já que todo o seu sentido poético fica enormemente prejudicado.

Em Romanji esses dois versos ficam assim:
“waku hi aku nin chiku da raku kon go sen
nen pi kan non riki fu nô son ichi mô“
“waku chi on zoku nyô kaku shu tô ka gai
nen pi kan non riki guen soku ki ji shin“.

Soku – Quer dizer rapidamente, imediatamente;
Ki – Se produzirá na pessoa;
Ji Shin – Compaixão, espírito de compaixão.
Esses versos tratam do espírito, da percepção da mente.

Uma mente não pacificada é terrível. É pior que o veneno de uma serpente, mais aterrorizante que o ataque de animais ferozes, mais implacável que um inimigo, mais sorrateiro que um ladrão, mais violento que um assassino, pior que os acidentes provocados pelo fogo ou pela água.

A humanidade é extremamente egoísta, completamente dominada por infindáveis desejos. Queremos comer mais, beber mais, nos divertirmos mais. Ate mesmo no Zendo, queremos nos sentar mais perto da Sensei, ficar mais tempo ao se lado, desejamos nos colocar num lugar onde possamos escutar melhor seus ensinamentos, para conseguir esse intento, usamos e abusamos de vários ardis e estratagemas. Estamos sempre pensando em nosso próprio bem-estar. Se isso acontece num zendo que dirá na vida de não religiosos.

Como poderemos nos harmonizar, como nos sintonizar com a vida, como largar esses desejos auto-centrados...

Sempre achamos que merecemos mais, o despertador toca e queremos ficar mais cinco minutos, alguém nos chama e sempre respondemos: “pêra aí” ou então “já vou”, fazemos isso porque cremos que o que estamos fazendo é mais importante do que seja lá o que for.

Sempre que aparece um desejo e eles aparecem o tempo todo, o corpo atua em função de satisfazer esse desejo, como é impossível satisfazer todos os desejos de nossa mente, de nosso ego, ficamos tristes, depressivos e amargurados, mesmo que consigamos satisfazer um ou dois desejos, outras centenas surgirão.

Durante o zazen podemos nos observar e verificar in locu quem realmente somos, assim conseguimos perceber que não tem nenhum ser feroz nos perseguindo, que são existe nenhum louco portando uma espada para nos ferir.

Kannon está por toda a parte, concentrar-se sobre o poder de Kannon é nada mais nada menos que nos harmonizarmos com o mundo.

Não percam a parte 12.


quinta-feira, 8 de dezembro de 2011


Parte 10.

“Se no grande oceano, entre perigos de peixes,
Dragões e demônios,
Pensar no poder de Kannon,
As ondas não o poderão submergir”.
Logo depois do fogo o sutra fala sobre os acidentes com a água.
É como se estivéssemos do nascimento até a morte em um grande oceano, totalmente perdidos e, rodeado de perigos e ameaças. Da mesma maneira é nossa consciência, muitas são as altas ondas que podem nos fazer submergir a qualquer momento.

O Ancestral do Karate Shotokan –Funakoshi Guichin, declara em seu Niju Kun – Os vinte preceitos para o praticante:
“Ao sair de casa pela manhã, acautele-se e mantenha a vigilância, mil perigos físicos e mentais o espreitam”.

Corremos o tempo todo atrás daquilo que gostamos e fugimos “enlouquecidamente” daquilo que detestamos. Amamos, odiamos e, às vezes, os dois ao mesmo tempo.

Somos como uma pequena embarcação totalmente á disposição das ondas num imenso e bravio oceano. Na maior parte do tempo, não conseguimos controlar o timão, ficando à mercê das altas ondas que nos jogam de um lado para o outro.

Somos invejosos, infelizes, coléricos.

Ora! Quem é feliz, não tem inveja, não tem raiva, não deseja o que não lhe pertence, não quer fazer mal a ninguém.

Se navegamos em calmas águas não precisamos nos preocupar. Se nossa mente está pacificada nada nos atinge, nenhuma onda nos fará submergir. Se andamos somente para o lado bom e correto da vida, o lado ruim a cada dia fica mais longe.

Agora se a cada passo dado produzimos mal Karma, ele nos seguirá como uma sombra, esperando apenas que reunidas as causas e condições ele se manifeste nos levando para o fundo do oceano.

Então começamos a correr, como se pudéssemos nos afastar do resultado de nossas ações. Ledo engano, quanto mais corremos mais chegamos perto da tempestade que nos levará de roldão em suas ondas.

“Se do topo do Monte Sumeru,
Pessoas quiserem empurrá-lo,
Pensar no poder de Kannon,
O fará pousar estaticamente, assim como o sol”.
O monte Sumeru, ou monte Sumi é uma montanha imaginária mais alta que o Himalaia, esse monte, essa montanha simboliza o ego. Estar no topo dessa montanha reflete o quanto estamos imbuídos de nós mesmos, o quanto é forte o sentido de “eu”.

Acreditamos que nossos pensamentos são os mais corretos, nossas ações são as mais justas. Se dotados de grande conhecimento, de muita intelectualidade, nosso orgulho é enorme, sempre achamos que temos razão, afinal, nós sabemos e o outro não. Por outro lado, os estúpidos, também são muito orgulhosos, acham que são discriminados e constantemente humilhados pelos inteligentes, assim se fecham numa couraça de orgulho e raiva.

Naturalmente que certa dose de confiança em si mesmo, é necessária, porém não suba no pedestal do ego, achando que possui a panacéia do mundo.

Desça imediatamente dessa montanha. Saiba ser simples.

As coisas mais importantes da vida são simples. O sol nascendo diariamente. A noite nos cobrindo com seu negro manto. Simples, porém capazes de produzir vida.

A prática do zazen nos fornece as ferramentas para percebermos onde estamos, se em cima da alta montanha do orgulho, da inveja, da ganância ou embaixo onde a temperatura é amena e a alimentação farta.

Não percam a parte 11.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011


Parte 9.

O budismo distingue três tipos principais de sofrimento:
1- O sofrimento causado pela vida. Sofremos ao nascer, ao crescer, ao ficarmos doentes, ao sermos privados de estar onde queremos e com quem desejamos, isso sem falar no sofrimento da idade avançada, principalmente no Brasil, onde a assistência médica deixa muito a desejar.
2- O sofrimento produzido pela mudança. Tudo se transforma, nada existe que seja estável, a única certeza que temos é que tudo é incerto. Quem não se lembra do refrão da música: Navegar é preciso, viver não é preciso – navegar é preciso por que se navega por precisos instrumentos e viver não é preciso, pois como tudo é instável, não existe precisão na vida e sim aleatoriedade.
3- O sofrimento produzido pelo infortúnio. Sofremos quando ficamos doentes, quando perdemos o emprego, quando morrem nossos pais e parentes, quando o casamento se acaba, quando nos assola uma manifestação da natureza e perdemos nossas posses etc.

Quando fazemos zazen regularmente, o apego ao ego vai diminuindo, arrefecendo. Deste modo o sofrimento e a ilusão vão se diluindo. A raiz do sofrimento existe dentro de nossa consciência. Sofre o rico com medo de perder o que tem e sofre o pobre porque pouco possui, esse fogo ao qual se refere o sutra não é físico e sim mental, derivado de nossos apegos ao mundo sensorial.

No Sutra Lankavatara está escrito:
“ ...Uma vez que o ignorante e o ingênuo não sabem que o mundo é algo visto unicamente pela própria mente, é que se apegam à multiplicidade dos objetos externos, que se apegam às noções de ser e não ser, unidade e diversidade, ambigüidade e não ambigüidade, existência e não existência, eternidade e não eternidade, e pensam que têm uma natureza do eu por si mesmos, e que tudo nasce das discriminações da mente, e que é perpetuada pela energia desse hábito, e do qual eles estão entregues a falsas imaginações”.

Segue o Sutra:

“Se alguma força do mal o jogar numa fogueira. Pensar no poder de kannon transforma a fogueira em água”.
Que força do mal seria essa.
O inferno não existe em outro mundo, em outra vida, mas sim, nesta vida, neste momento, em nossa própria consciência. O fogo da raiva, da paixão descontrolada, dos desejos de posse e da ganância são como verdadeiros vulcões em erupção. O ego desaparecendo, não há tristezas, não há fogo, não há mais inimigos. A fogueira se apaga e no lugar aparece um lindo canteiro de flores.
Abandone tudo o não seja seu, tudo que é emprestado no seu ser e então será capaz de sentir de escutar a voz de Kannon. A coisa que você chama de consciência não é a sua consciência, é um substituto, uma pseudo-consciência, falsa, imitada, limitada.
Abandone-se em Kannon!
E nesse abandonar, seja capaz de enxergar a sua consciência verdadeira que tem lhe esperado, que está lhe aguardando.

Para abandonar o que não é seu e portanto não lhe pertence, apenas sente-se em zazen. Sente-se confortavelmente sem pensar em nada em especial, sem conceituar os pensamentos como bons, agradáveis ou neutros. Apenas sente-se e não queira nada, não deseje nada, não tenha aversão a nada não espere nada. Permita que as coisas sejam apenas o que são. Sente-se apenas. Com esse sentar não existirá mal que o jogue numa fogueira.

Não percam a parte 10. 

sábado, 3 de dezembro de 2011

Parte 8.

“Fez um voto vasto e profundo como os oceanos, Inconcebível na sua eternidade”.
Kanzeon formula esse grande juramento, assistido por todos os Budhas e Bodisatvas do passado do presente e do futuro. Todos somos Budhas em potencial. Todos possuímos a “Natureza Budha”,porém sem a necessária introspecção advinda da prática regular do zazen, tal“natureza” não consegue se manifestar.

O Zen prosperou na China e depois no Japão, por causa dos mestres que professaram grandes votos profundos, aqui no Brasil, temos a possibilidade de estudar com a Coen Roshi, que tem como votos profundos dar a conhecer por todos a maravilha que é o Zen Budismo, vasta conhecedora e praticante incansável, segue perseguindo seus votos. Que possamos todos nós, a seu exemplo, fazer o mesmo.

No quarto capítulo Shushogi está escrito:
“Acordar a mente Bodhi significa fazer o voto de não atravessar para a outra margem antes que todos os seres o tenham feito. Quer laico ou monástico, quer vivendo no mundo de seres celestiais ou humanos, sujeito à dor ou ao prazer, todos rapidamente devem fazer este voto”.

E você...Quais são os seus votos profundos....

“Foi ao servir infinitos Budhas que despertou para esse juramento de grande pureza. Deixe-me brevemente explicá-lo.”
Ao recitarmos a linhagem dos Budhas e Ancestrais do Dharma, percebe-se que antes do nome do Budha Sakyamuni, aparecem outros seis Budhas (Bibashibutsu, Shikibutsu, Bishafubutsu, Kurusonbutsu, Kunagonmunibutsu, Kashobutsu). Kanzeon serviu a todos esses Budhas e, conforme o Sutra, foi enquanto servia a esses Budhas do passado que ela despertou para o enorme sofrimento dos seres sencientes, então fez esses votos quase inconcebíveis, tão vastos e profundos como os oceanos.

Segue o Sutra com o Budha enumerando os poderes transcendentais de Kanzeon:

“Quem ouve seu nome, vê sua presença
E sempre o mantém no coração e na mente, poderá terminar com as tristezas da vida. Se alguma força do mal o jogar numa fogueira, pensar no poder de Kannon, transformará a fogueira em água”
Diversas são as formas de invocar o seu nome: “Namu Avalokitesvara Bodhisattva” (sânscrito), “Namu Guanshiyin Bossatsu” (chinês),“Namu Kanzeon Bossatsu” (japonês), “Homenagem ao Bodhisattva Contemplador dos Sons do Mundo” (português).
No Capítulo X do Sutra (Os Mestres da Lei), o Budha admoesta o Bodhisatva Rei da Medicina sobre os quesitos para aqueles que queiram expor o Sutra de Lótus após a sua extinção:
“Este bom homem ou boa mulher deverá entrar no quarto do Tathagata, vestir o manto do Tathagata, sentar no trono do Tathagata e somente então expor este Sutra em prol da Assembléia aos crentes”.
O ‘Quarto do Tathagata’ é o sentimento de grande compaixão para com todos os seres viventes. Portanto, a compaixão é a primeira condição para o acesso a esse Portal e é representada por este Bodhisattva Contemplador dos Sons do Mundo - Kanzeon.

Quem ouve seu nome, vê sua presença. O que significa essa frase.
Quando escutamos o nome de alguém, imediatamente a imagem mental dessa pessoa surge em nossa mente, com todas as suas qualidades e defeitos, da mesma maneira, ao pronunciarmos o nome de Kannon poderemos ver seu corpo e sentir sua presença.

Escutar o nome de uma pessoa amada, alegra e conforta o coração de quem ouve. Por isso ficamos tão felizes ao escutar a voz de um filho que está longe ou de uma namorada que se encontra separada de nós. Nomes possuem grande influência sobre a consciência, por isso é tão importante a recitação sistemática desse Sutra.

Se nos concentramos no nome de alguém, podemos ver a pessoa na sua totalidade. Escutar um nome desarquiva tudo que possuímos guardado em nossa mente sobre essa pessoa. É como se estivéssemos acessando informações arquivadas num dossiê em nossos arquivos mentais. Nossa atitude, respiração e intenções se alteram em conformidade com os arquivos vão sendo acessados

Da igual maneira, ao vermos um plácido riacho e escutarmos o murmúrio de suas águas, somos naturalmente imbuídos de grande paz e tranqüilidade, além de percebermos a efemeridade e transitoriedade da vida. Mais é importante não cair no misticismo. Kannon está além da forma física.

Na língua japonesa costuma-se dizer que Kannon é “Muso” – Não aspecto, não forma, ela existe em todas as partes, em todos os lugares, em todo o universo.
Não podemos enxergá-la com nossos olhos, não podemos ouvi-la com nossos ouvidos, só podemos nos conectar com ela, quando estamos desprovidos de desejos egoístas, do apego aos fenômenos sensoriais. Quando nossa mente não é mais continuadamente invadida e perturbada por medos, inseguranças e ansiedades.

Então se estamos devidamente alertas, vivendo o aqui-e-agora, sem deixar passar nada em vão, podemos ver o corpo de Kannon e escutar sua voz, assim nos libertando do vai-e-vem da alegria e sofrimento.

Quando percebemos que a vida é efêmera, a partir dessa verdade podemos ver o mundo como ele verdadeira é, impermanente e impessoal.

Não percam a parte 9.


sexta-feira, 2 de dezembro de 2011


Parte 7.

Começa o Sutra em sua parte recitativa:

“Honrado do Mundo, possuidor de todos os sinais sutis...”
O Budha é chamado de vários nomes, em sânscrito é normalmente usado o termo Baghavan que significa: “O mais respeitado, o supremo iluminado”.
Sinais sutis - são as 32 marcas principais e 80 marcas secundárias que o Budha possui desde seu nascimento, demonstrando a sua suprema iluminação.

“...Novamente permita-lhe perguntar sobre os relacionamentos desta Criança-Budha. Porque razão é chamada de Kanzeon?”.
O Bodisatva da Intenção Inesgotável pergunta sobre os relacionamentos, isto é, como Kanzeon se relaciona com as pessoas, como as ajuda e porque se chama kanzeon.
A iluminação não é privilégios de uns poucos escolhidos, ela está ao alcance de todos. Kanzeon não é iluminada para si, mas para os outros. Seus ouvidos estão sempre abertos aos sons do mundo, aos sofrimentos de todos os seres, por isso ela é chamada de kanzeon, que numa tradução literal significa: Observador dos sons do mundo.
Conforme descrito no sutra: “Bom homem, suponha que existam imensuráveis centenas, milhares, dezenas de milhares, milhões de seres viventes que padecem vários sofrimentos e provações. Se eles ouvirem o nome do Bodisatva Kanzeon e concentradamente invocarem o seu nome, ele ouvirá o som das suas vozes e todos serão libertados das suas provações.”

“E Budha respondeu: Ouçam! Kanzeon pratica o bem em todos os locais e direções.”
Infinitos são os seres neste mundo, desde a vida celular mais primitiva até o atual homem evoluído, todos sem exceção experimentam um grande número de sofrimentos em sua existência. Infelizmente o homem acredita que é o único ser sensível no universo, assim pensando, causa muito prejuízo à vida na terra, isso sem falar no dano que causa aos seus próprios pares.

Assassinamos continuadamente a natureza, exterminamos os animais, poluímos nossos rios, abrimos um buraco cada vez maior na camada de ozônio. Para que possamos satisfazer um ego cada vez mais exigente, depredamos o meio ambiente, acabamos com tudo aquilo que nos cerca. Estupramos toda a virgindade da lei cósmica.
Um homem escravo de seu ego, nunca poderá conhecer a verdadeira liberdade e seus sofrimentos serão cada vez maiores.
Kanzeon, está sempre disposta a ajudar a todos sem distinção, apenas devemos estar sintonizados com ela como um rádio de alta freqüência para podermos captar e receber sua ajuda.

“Fez um voto vasto e profundo como os oceanos, inconcebível na sua eternidade. Foi ao servir infinitos Budhas que despertou para esse juramento de grande pureza. Deixe-me brevemente explicá-lo:”
O que são votos profundos...
Existem basicamente dois tipos de votos. Os comuns e os profundos. Todo mundo tem aspirações, todos fazemos juras, votos, promessas. Quando somos jovens, queremos passar para a faculdade de nosso interesse, seguir uma carreira de sucesso, arrumar várias namoradas, ser considerado por nossos amigos etc.

Na idade adulta, desejamos dinheiro, fama e prestígio. Se conseguirmos ganhar bastante dinheiro, desejamos fazer parte da elite, daqueles que mandam. Queremos ser reconhecidos, amados, possuir uma casa na praia, um sítio na montanha, um carro que chame a atenção.

Quando estamos velhos desejamos saúde, tranqüilidade financeira, bons amigos e que nossos filhos não nos abandonem.
Esses são as promessas comuns. A maioria morre sem conseguir alcançar nada disso.
Na nossa tradição, monges também fazem votos – Os votos do Bodisatva:
“Seres são inumeráveis, faço o voto de salva-los.
Paixões são inexauríveis, faço o voto de extingui-las.
Portais do Dharma são inatingíveis, faço o voto de alcançá-lo.
O caminho do Budha é inatingível, faço o voto de atingi-lo”.
Os seres são inumeráveis, isso é um fato indiscutível, fazer o juramento de ajudar a todos, de levar a todos o conhecimento, o esclarecimento é uma promessa postulada por todos aqueles que recebem os preceitos e adentram o caminho budista.

Por mais numerosas que sejam as paixões e, elas são... Há! Como são... Faço o voto de vencê-las todas. Nossos desejos são infinitos e cada desejo atendido ou não, produz uma série de outros desejos. Por mais profundo que seja o Dharma de Budha, faço o voto de compreendê-lo totalmente.

Dizem que existem mais de 10.000 volumes de Sutras, se formos adicionar os comentários sobre os Sutras chegaremos a uma cifra bastante elevada, até porque cada sutra foi comentado ao longos séculos 30, 40, 50, 100, 500 vezes. Atualmente se comenta sobre o comentário dos comentários dos Sutras.
Por isso é tão difícil, compreender o budismo em sua totalidade através apenas da leitura dos Sutras, comentários etc.

Já tive a oportunidade de ler centenas de livros sobre o budismo, em somente alguns consegui aprender alguma coisa que não me tivesse sido ensinado no templo ou na observação dos atos e palavras de minha mestra, mesmo assim, nada que aprendi através da leitura foi muito importante, apenas informações, curiosidades, detalhes históricos e muita confusão de escolas e tradições.

A prática com um mestre correto é o caminho para compreensão do Dharma.
O caminho do Budha é perfeito, faço o juramento de realizá-lo. Realizar esse intento é uma tarefa hercúlea, requer um esforço diuturno, aqueles que não praticam zazen regularmente dificilmente conseguirão sequer chegar perto desse juramento. É o zazen que nos oferece as ferramentas necessárias para que consigamos realizar esses quatro grandes votos profundos.

Não percam a parte 8.


quinta-feira, 1 de dezembro de 2011


Parte 6.

Essas são minhas considerações pessoais (Não representa obrigatoriamente o pensamento da Soto Zen Shu).

Como todos os sutras, o Kannon Gyo se divide em duas partes.
Primeiro um texto, com um conteúdo mais lógico, racional, conceitual e depois um poema que repete o mesmo que o texto, porém de forma resumida, poética e recitativa.
O Sutra de Lótus da lei Maravilhosa relata o sermão do Budha realizado no Monte Gridhrakuta, para milhares de pessoas.
O texto do capítulo XXV do sutra começa com o Bodisatva da Intenção Inesgotável (Akshayamati).
Ele levanta-se do seu lugar, descobre o ombro direito, junta as palmas das mãos e, fitando o Budha, ele pergunta:
Akshayamati é o Bodisatva da Intenção Inesgotável, como todo Bodistava ele possui grande compreensão do Dharma. Ora, se possui grande entendimento, nutre pouca ou quase nenhuma dúvida, pois compreende claramente a doutrina do Budha e, naturalmente sabe quem é Kanzeon, então porque fez essa pergunta ao Budha...

Os sutras dizem que existem quatro tipos de pessoas que fazem perguntas.
1- As que nada sabem, mas querem aprender;
2- As que possuem algum conhecimento, mas ainda tem muitas dúvidas;
3- As que possuem outro tipo de entendimento e, estando presas a esse conhecimento não conseguem compreender outros, ficando o tempo todo colocando a prova o professor e aquilo que ele diz;
4- As que compreendem tudo, porém efetuam perguntam para ajudar a compreensão dos que estão escutando a preleção.

Começa o capítulo com o Bodisatva Akshayamati se levantando de seu assento, e fazendo uma pergunta ao Budha. Levantar do assento significa abandonar os pontos de vista pessoais, abandonar o ego, converter-se num copo vazio, pronto para receber em seu interior o ensinamento. Somente assim, a informação pode chegar ao espírito.

Nos mosteiros japoneses é comum efetuar-se sanpai (3 prostações), antes de se fazer uma pergunta. Não devemos fazer uma pergunta ao nosso mestre em voz alta, coçando a cabeça, sentados incorretamente, de forma desrespeitosa, sem fazer Gassho. Somos monges e não mendigos, fazer Gassho e efetuar uma pergunta numa postura de respeito é uma atitude de dignidade, não somente para o mestre, mas para nós mesmos.

O Bodisatva Akshayamati se levanta e pergunta...
A resposta vem imediatamente... “Ouçam!...”diz o Budha.

Quando se faz uma pergunta a alguém. Ex: Como você está! A resposta deve vir assim que a pergunta acabar, não depois de alguns minutos de reflexão. Se deixarmos escapar o momento presente, o aqui-e-agora, se estivermos desatentos o precioso momento, foge. A ação decorrente de uma mente distraída nunca é correta, os erros surgem e a felicidade se transforma em sofrimento.

O texto se desenvolve, apresentando numerosos relatos da força de Kanzeon. Esse Sutra é diferente do Sutra do Coração ou do Sutra do Diamante que são um pouco mais difíceis de compreender. Na leitura desse sutra notamos que o nome kanzeon é repetido várias vezes, fazendo com que sua sonoridade fique ritmada, transformando o sutra numa leitura fácil de ler, gravar e recitar.

Não percam a parte 7.