Saudações:

Em homenagem e reverência profunda à minha Mestra de Ordenação e Treinamento, Venerável Shingetsu Coen Osho.
Que seu Corpo-Dharma, seja como um diamante inquebrantável.
Que tenha próspera longevidade e saúde ilimitada.
Que nenhum mal a atinja.
Que todos os seus esforços sejam recompensados.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Como as contas de restaurantes são capazes de modificar o universo

Seguindo a mesma linha de raciocínio...

O que poucos sabem é que esse lugares vitais para a vida humana, são também vitais para o universo e para a sua maneira de comportar-se, se é que pode mos chamar assim.

O trecho abaixo, retirado do segundo volume da série do Guia do Mochileiro das Galáxias, define bem, a importancia e como os restaurantes podem manipular o universo.

(vide A Vida, O Universo e Tudo o Mais; capítulo 07)

O Propulsor Bistromático é um novo e maravilhoso método de cruzar vastas distâncias interestelares sem todo o perigo envolvido em ficar mexendo com Fatores de Improbabilidade.

A Bistromática em si é apenas uma nova e revolucionária forma de entender o comportamento dos números. Assim como Einstein observou que o tempo não era absoluto, mas algo que dependia do movimento de um observador no espaço, e que o espaço não era absoluto, mas dependia do movimento do observador no tempo, hoje sabemos que os números não são absolutos, mas dependem do movimento do observador nos restaurantes.

O primeiro número não-absoluto é o número de pessoas para quem a mesa está reservada. Ele irá variar no decorrer das primeiras t rês ligações para o restaurante e depois não apresentará nenhuma relação aparente com o número de pessoas que realmente estarão presentes, ou com o número de pessoas que irão se juntar a elas depois do show, partida, festa, filme, ou ainda com o número de pessoas que irão embora ao ver quem mais apareceu por lá.

O segundo número não-absoluto é a hora real de chegada. Este numero é hoje conhecido como um dos mais bizarros conceitos matemáticos, uma reciproversexclusão, um número cuja existência só pode ser definida como sendo qualquer outra coisa diferente de si mesmo. Em outras palavras, a hora real de chegada é o único momento no tempo no qual é impossível que qualquer participante do grupo chegue de fato. A recíproversexclusão tem, atualmente, um papel vital em diversos campos da matemática, incluindo a estatística e contabilidade, além de fazer parte das equações básicas usadas na enge nharia dos campos de Problema de Outra Pessoa.

O terceiro e mais misterioso não-absolutismo de todos diz respeito à relação entre o número de itens na conta, o valor de cada item e o número de pessoas na mesa, assim como quanto cada uma delas está disposta a pagar. (O número de pessoas que trouxeram algum dinheiro é apenas um subfenômeno desse campo.)

As assombrosas discrepâncias que costumavam ocorrer nesse ponto passaram décadas sem ser estudadas simplesmente porque ninguém as levou a sério. No passado, as pessoas diziam que essas coisas eram causadas pela educação, falta de educação, avareza, desejo de aparecer, emotividade ou simplesmente porque já era tarde, e tudo era esquecido na manhã seguinte.

Nunca foram feitos testes em laboratório, é claro, porque nada disso acontecia nos laboratórios ― pelo menos não em laboratórios de boa reputação.

Foi apenas com o surgimento dos computadores de bolso que a espantosa verdade finalmente se tornou evidente. Era a seguinte: Os números escritos em contas de restaurantes dentro dos confins de restaurantes não seguem as mesmas leis que os números escritos em qualquer outro tipo de papel em outros lugares do Universo.

Esse fato singelo causou enorme alvoroço no mundo científico. Foi uma revolução completa. Realizaram-se tantas conferências matemáticas em bons restaurantes que as mentes mais brilhantes de toda uma geração morreram de obesidade e doenças cardíacas, retardando os progressos da matemática em alguns anos.
Aos poucos, contudo, as implicações dessa idéia começaram a ser entendidas. No início a coisa toda era muito radical, muito doido na, o tipo de coisa que faria uma pessoa normal dizer: "Sim, claro, exatamente o que eu teria dito." Então inventaram algumas frases como "Frameworks de Subjetividade Interativa" e, a partir daí, as pessoas relaxaram e puderam levar adiante a teoria.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

DE COMO SURGIU O BUDISMO

O Budismo surgiu da insatisfação de um jovem príncipe, chamado Sidarta Gautama Sakyamuni, que nasceu na cidade de Kapilavastu, localizada no centro-norte da Índia, atualmente Nepal, no oitavo dia do quarto mês, há Aproximadamente 565a.C.
Conta a tradição que Sidarta levava uma vida luxuosa, cheia de confortos e regalias, sem que nada lhe pudesse dar a idéia das agruras e vicissitudes da vida. Seu pai, o Rei Sudodhana, empenhava-se tanto em mantê-lo afastado dessas realidades, que proibiu-o de ultrapassar as muralhas do palácio, onde ele usufruía do luxo e da riqueza. Alimentos maravilhosos, contato somente com pessoas bonitas e alegres, belos e bem cuidados jardins e pomares, enfim, tudo aquilo que um ser humano pode desejar como agradável para os sentidos.
Após certos acontecimentos, o jovem Sidarta resolveu sair do palácio e aventurar-se pelas estradas e cercanias da cidade que seu pai governava. Conta a tradição, que num dado momento, ele viu um homem extremamente velho, enrugado, encurvado que caminhava com bastante dificuldade, apoiando-se sobre uma bengala. Aquilo o deixou horrorizado, porque ele nunca havia se dado conta de que as pessoas envelheciam e entravam em decadência física.
Continuando o passeio, o príncipe encontrou um outro homem que chamou sua atenção, desta vez não tão velho, mas com o corpo e o rosto inteiramente dilacerados por feridas causadas por algum tipo de doença terrível. Isso foi um novo choque. Em toda a sua jovem vida, ele jamais percebera que as pessoas podem ser acometidas por doenças horríveis.
Mais adiante, ele se deparou com um cadáver já meio devorado pelos lobos e chacais. Aquilo o abalou profundamente. Sidarta não tinha consciência de que na vida todos caminham incessantemente para a morte.
No caminho de volta, ele se deparou com um peregrino (espécie de homem considerado santo na Índia - sadhu), que apesar de quase nu, e sem nada possuir, além de uma tigela para mendigar comida e um bastão, aquele homem parecia estar tranquilo, seu rosto irradiava paz, dignidade e contentamento.
Profundamente combalido e decepcionado com as cenas terríveis que presenciara em seu passeio e, assustado por não ter tido anterior conhecimento sobre tudo aquilo que presenciou, retornou ao palácio. Ali refletiu longamente e qualificou o que vira como as três marcas da impermanência (velhice, doença e morte). Entretanto, a lembrança do peregrino deu-lhe a certeza de que a única maneira de extinguir aquela angústia imensa que dele se apoderara era o abandono físico e mental daquela vida de confortos e acomodação material. Tomada essa decisão, assim ele fez, abandonou a casa paterna para tentar encontrar uma resposta para tanto sofrimento por que passam os seres.
Durante os seis anos seguintes, o ex-príncipe estudou com os maiores mestres da época todos os modos de espiritualidade conhecidos até então. Desde o estudo erudito das mais profundas leis espirituais, até a mortificação mais severa. Mas, nada disso o satisfez, não tinha encontrado ainda o lenitivo final para as angústias e sofrimentos humanos, fossem eles físicos ou mentais.
Após ter percebido que ainda não fora inventado o remédio para aquele tipo de "doença", resolveu ele, por conta própria, tentar descobri-lo. Desta vez iria procurar a resposta dentro de sí, pois inutilmente a procurara fora e não a encontrara. Sentou-se debaixo de uma velha e imponente figueira, disposto a não mais se levantar até descobrir o fim do sofrimento. Ali ficou durante 49 dias, em profunda e silenciosa meditação. Sidarta, então experimentou e ultrapassou todos os níveis de consciência, chegando até a suprema iluminação, o Nirvana. Neste momento, ele transformou-se no Buda, que significa "o supremo iluminado, totalmente consciente" . Contava ele com 35 anos de idade. A partir deste momento, e até o dia de sua morte aos 80 anos, ele viajou por todo o noroeste da Índia, partilhando com um número crescente de discípulos as suas experiências e sua luz.
O Budismo baseia-se no conceito de que tudo é ilusório, transitório e portanto impermanente. A busca essencial consiste em se ultrapassar a ilusão rumo à perfeita consciência, que é o estado de Nirvana. É também conhecido como o "Caminho do meio", por afastar-se dos extremos, tais como escetismo de um lado e luxuosidade de outro. Além desses elementos a doutrina budista baseia-se também nas Quatro Nobres Verdades e na chamada Nobre Senda Óctupla.
O budismo ao longo de todos esses séculos dividiu-se em três principais ramificações: O budismo Theravada, ou a doutrina dos antigos. É um sistema muito ortodoxo, baseado nos princípios monásticos indianos. O budismo Zen, que é a forma chinesa e japonesa de explicar a doutrina. É considerada a maneira mais rápida e direta de se compreender o método de iluminação de Buda. Dá muita ênfase na meditação e nas artes. É o ramo de maior prestígio no Ocidente. O budismo Tibetano ou Lamaismo é o sincretismo entre o Budismo, o Tantrismo e o Bon Po (prática Xamânica que era a religião original do Tibete).
Assim como todas as grandes religiões, o Budismo tem muito de sabedoria para nos oferecer. Na próxima semana, mais história sobre Buda e sua filosofia.

A Ratoeira


A RATOEIRA


Um rato, olhando pelo buraco na parede, vê o fazendeiro e sua esposa abrindo um pequeno embrulho. Imediatamente, pensou logo no tipo de comida que poderia haver ali. Ao descobrir que era uma ratoeira ficou aterrorizado. Correu ao pátio da fazenda advertindo a todos:
            "- Há uma ratoeira na casa, uma ratoeira na casa !!! "
            A galinha, disse:
            "- Desculpe-me sr. rato, eu entendo que isso seja um grande problema para o senhor, mas não me prejudica em nada, não me incomoda nem um pouco."
            O rato foi então correndo até o porco e lhe disse:
            "- Há uma ratoeira na casa, uma ratoeira !!!"
            "- Desculpe-me sr. rato, disse o porco, mas não há nada que eu possa fazer, a não ser rezar. Fique tranqüilo que o senhor será lembrado nas minhas preces."
            O rato dirigiu-se então, desesperado, à vaca.
            Ela lhe disse: O que sr. rato? Uma ratoeira? E eu com isso? Por acaso estou em perigo? Acho que não!"
            Desiludido e morto de medo o rato voltou para a casa, cabisbaixo e abatido, só pensava na horrível ratoeira do fazendeiro.
            Naquela noite ouviu-se um barulho, como o de uma ratoeira pegando sua vítima. Todos ficaram sobressaltados.
            A mulher do fazendeiro correu para ver o que a ratoeira havia pego. No escuro e com sono, ela não percebeu que a ratoeira havia aprisionado a cauda de uma cobra venenosa e não um rato.
            E a cobra picou a mulher...
            O fazendeiro a levou imediatamente ao hospital. Ela ficou muito mal. O médico recomendou que ela fosse bem alimentada e a mandou de volta para casa alguns dias depois , ainda com febre.
            Todo mundo sabe que para alimentar alguém fraco, doente e com febre, nada melhor que uma canja de galinha. O fazendeiro pegou seu cutelo e foi providenciar o ingrediente principal. Matou a galinha.
            Como a doença da mulher continuava, pois a cobra era muito venenosa, os amigos, parentes e vizinhos vieram visitá-la.
            Para alimentá-los o fazendeiro teve que providenciar muita comida, afinal alguns parentes vieram de longe. Matou o porco.
            A mulher não melhorou e acabou morrendo. Muita gente veio para o funeral, foi uma choradeira só, a mulher era muita querida por todos. O fazendeiro teve que arrumar mais comida para alimentar todo aquele povo que não parava de chegar. Sacrificou a vaca.
Nesta mesma noite o rato morreu esmagado na ratoeira que tinha sido montada de novo.

Moral da história: Na próxima vez que você ouvir dizer que alguém está diante de um problema e acreditar que o problema não lhe diz respeito, lembre-se:
“Quando há uma ratoeira na casa, toda a fazenda corre risco”. O problema de um, é problema de todos !

Getulio Taigen

segunda-feira, 29 de agosto de 2011


A PARÁBOLA DE MUSHIN

Há muito tempo, numa cidade chamada Esperança, vivia um rapaz chamado Joe. 

Ele estava muito dedicado ao estudo do dharma e, por isso, tinha um nome budista: Mushin. 
Sua vida era igual à de todo mundo. Ia para o trabalho e tinha uma boa esposa; mas, apesar de seu interesse pelo dharma, era machão, sabido, amargo. 
Aliás, era tanto desse jeito que um dia, depois de ter criado toda espécie de confusão no trabalho, seu patrão lhe disse: "Basta, Joe. Você está despedido!". 
Assim Joe saiu. Desempregado. Quando chegou em casa, encontrou uma carta da esposa na qual dizia: "Para mim chega, Joe. Fui embora. 
Foi desta maneira que ele ficou com o apartamento, consigo mesmo, e nada mais.Mas Joe, Mushin, não era alguém que desistia com facilidade. 
urou que embora não tivesse emprego nem esposa iria conseguir aquilo que realmente importava: a iluminação. Foi até a livraria mais próxima. 
Procurou nas edições mais atualizadas como chegar à iluminação. Encontrou um livro que lhe chamou a atenção em particular. Chamava-se How to catch the train ofenlightenment (Como pegar o trem da iluminação). 
Comprou-o e começou a lê-lo com muito cuidado. Depois de tê-lo estudado até o fim, foi para casa e abriu mão do apartamento, colocou todos os seus pertences seculares numa mochila e dirigiu-se à estação ferroviária nos limites da cidade. 
O livro dizia que se a pessoa seguisse todas as instruções - faça isso, faço aquilo - o trem chegaria e ela conseguiria pegá-lo. Ele pensou: "Fantástico!".
Joe foi até a estação ferroviária, que era um local deserto, leu o livro mais uma vez, decorando as instruções, e acomodou-se para esperar. 
Esperou muito tempo. Por dois, três, quatro dias, esperou a             chegada do Trem da Iluminação porque o livro dizia que viria com certeza. Ele tinha uma fé imensa no livro. 
Quando, no quarto dia, ouviu aquele enorme rumor à distância, aquele resfolegar imenso. Sabia que devia ser o Trem. Então se aprontou. Ficou tão excitado porque o Trem estava vindo, que mal conseguia acreditar... e... uuush... o Trem passou direto! Foi tão rápido que não passou de uma mancha. O que tinha acontecido? Ele não tinha conseguido pegá-lo!
 Joe ficou admirado, mas não desanimou. Pegou de novo o livro e estudou mais alguns outros exercícios; trabalhou bastante enquanto sentava-se na plataforma, entregando tudo que tinha àquela decisão. 

Cerca de três ou quatro dias depois ouviu de novo o imenso barulho ao longe e, desta vez, estava seguro de apanhar o Trem. De repente, lá estava ele... uusshh... passando sem parar. Bem, o que fazer? E   evidente que havia um Trem, não era o caso de não existir. Ele sabia disso, porém não conseguiu apanha-lo. Então, estudou e tentou cada vez mais, trabalhou sem parar e toda vez acontecia à mesma coisa.
Com o tempo, outras pessoas também foram à livraria e compraram o livro. Então, Joe começou a ter companhia. Primeiro eram umas quatro ou cinco pessoas, esperando pelo Trem, e logo depois reuniram-se trinta ou quarenta. 

A excitação era imensa! Ali estava a Resposta, vindo sem sombra de dúvida. Todos podiam ouvir o barulho que o Trem fazia ao passar e, apesar de ninguém jamais conseguir subir nele, havia uma grande fé de que algum dia, de algum jeito, um deles finalmente o apanharia. Se ao me­nos uma só pessoa conseguisse pegá-lo, serviria de inspiração para as demais. 
Assim, foi aumentando a pequena multidão e a excitação era maravilhosa. Com o tempo, porém, Mushin observou que algumas daquelas pessoas traziam seus filhos pequenos. E ficavam tão absortas procurando pelo Trem que, quando as crianças queriam a atenção de seus pais, estes lhes diziam: "Não incomodem, vão brincar!". Aquelas criancinhas estavam realmente sendo negligenciadas. 
Mushin, que afinal de contas não era um sujeito tão ruim assim, começou a ponderar: "E, cara, eu bem que gostaria de esperar o Trem, mas alguém tem de tomar conta dessas crianças". Por isso, começou a dedicar um certo tempo a elas. Olhou em sua mochila e tirou de lá nozes, passas e barras de chocolate e distribuiu tudo entre a garotada. 
Algumas estavam mesmo esfomeadas. Os pais que estavam esperando pelo Trem não pareciam sentir fome, mas seus filhos sentiam, e estavam com os joelhos esfolados. 
Então, Mushin encontrou uns curativos na mochila, cuidou dos arranhões, e depois leu para eles histórias dos livrinhos que tinham.
Começou a acontecer que, embora ele ainda desse uma certa atenção para o Trem, as crianças passaram a ser sua principal preocupação. 

Havia um número cada vez maior delas. Em poucos meses havia adolescentes também e com a chegada deles acumulou-se muita energia e vigor. 
Mushin então organizou os adolescentes e criou um time de beisebol atrás da estação. Começou a cultivar um jardim para mantê-los ocupados, e chegou a incentivar algumas das crianças mais ordeiras a ajudá-lo. 
Antes que percebesse, ele tinha um grande empreendimento em andamento. Tinha cada vez menos tempo para o Trem  e estava com raiva disso. O que era importante estava acontecendo com os adultos que esperavam pelo Trem, contudo ele tinha de tomar contar de tudo aquilo com os garotos e assim sua raiva e amargura estavam fervilhando. 
Porém, independente disso, sabia que tinha de cuidar das crianças e tomava conta delas.
O tempo passava, e centenas e milhares de observadores do Trem chegavam com seus filhos e parentes. Mushin estava tão 

atolado com as necessidades das pessoas que teve de aumentar as instalações da estação. 
Providenciou mais alojamentos para dormir; teve de construir um correio e escolas, e estava sempre ocupado, mas sua raiva e seu ressentimento também estavam bem ali. "Sabe, só estou interessado na iluminação. 
Aquelas outras pessoas todas estão esperando o Trem e o que eu estou de fato fazendo?" Entretanto,  continuava tomando conta de tudo.
Então, certo dia, lembrou-se de que embora tivesse dado a maioria dos livros que tinha em seu apartamento, por algum motivo, tinha guardado um pequeno volume. Pegou-o de dentro da mochila. O livro era How to do zazen (Como fazer zazen). Agora Joe tinha um novo conjunto de instruções para estudar, e essas não pareciam tão ruins. 

Acomodou-se para aprender como fazer zazen. Bem cedo de manhã, antes que os outros se levantassem, ele se sentava em uma almofada para praticar um pouco. 
Com o passar do tempo, aquele programa frenético e exigente de trabalho em que inadvertidamente se envolvera não lhe parecia mais tão opressor. 
Começou a pensar que talvez existisse alguma ligação entre este zazen, este sentar, e a paz que estava começando a sentir. Uns poucos na estação também começavam a ficar desencorajados com o Trem que não conseguiam apanhar, e começaram a se sentar com Joe. O grupo fazia zazen todas as manhãs e, ao mesmo tempo, a empresa da espera-do-Trem continuava em expansão. 
Na próxima estação, logo mais abaixo na linha, havia uma colônia inteiramente nova de aguardadores do Trem. 
Os mesmos problemas de sempre já estavam aparecendo ali, por isso seu grupo ia até lá de vez em quando para ajudar a solucionar as dificuldades. 
Chegou mesmo a ser construída uma terceira estação... um trabalho infindável.
Estavam todos trabalhando muito mesmo. De manhã à noite alimentavam as crianças, faziam serviços de car­pintaria, administravam o correio, instalavam uma nova clínica pequena, tudo que uma comunidade precisa para funcionar e sobreviver. Nesse tempo todo eles não estavam conseguindo esperar pelo Trem. As coisas apenas se mantinham em andamento. 

Eles conseguiam ouvir o barulhão e ainda restava um pouco de ciúme e de amargura. Contudo, apesar disso, eram forçados a admitir, não era mais o mesmo. 
Estava ali, mas  também não estava. O ponto de mutação para Mushin ocorreu quando tentou fazer uma coisa que seu livrinho descrevia como sesshin.
Reuniu-se com seu grupo, num canto da estação ferroviária, criaram um espaço em separado e durante quatro ou cinco dias praticavam intensamente o zazen. 

De vez em quando ouviam o trovejar do Trem à distância, mas ignoravam-no e continuavam sentados. Apresentaram essa difícil prática também nas demais estações.
 Mushin estava agora com cinqüenta e poucos anos. Demonstrava o efeito do tempo de tensão e de trabalho. Estava ficando arcado e cansado. Mas, nesse momento, não se preocupava mais com as coisas da mesma maneira que antes. Esquecera-se das grandes questões filosóficas que costumavam apreendê-lo: "Existo de fato?"; "A vida é real?"; "A vida é um sonho?". 

Estava tão ocupado sentado e trabalhando que tudo o mais se esvanecia, exceto o que precisava ser feito a cada dia. A amargura desapareceu. As grandes questões desapareceram. Finalmente, não havia mais nada para ele, exceto o que tinha de ser feito. No entanto, Mushin não sentia mais que era o que tinha de ser feito; apenas o fazia.
 Havia, por essa época, uma comunidade imensa de pessoas nas estações ferroviárias, trabalhando, vindo com seus filhos, além dos que estavam esperando pelo Trem. Algumas destas voltavam aos poucos para a comunidade, enquanto outras iam chegando. 

Mushin por fim começou a amar as pessoas que também estavam esperando pelo Trem. Ele as servia e as ajudava a esperar. Isso prosseguiu por muitos anos.
Mushin foi ficando cada vez mais velho e cansado. As questões que tinha foram acabando até não restar mais nenhuma. Havia apenas Mushin e sua vida, fazendo a cada segundo o que precisava ser feito.

Certa noite, por uma razão ou outra, Mushin pensou: "Vou ficar sentado a noite toda. Não sei por que desejo fazer isso. Vou apenas fazê-lo". Para ele, o sentar não era mais uma questão de ir em busca de alguma coisa, de tentar melhorar, de tentar ser santo. Todas aquelas idéias já se desfizeram há muitos anos. Para ele, não havia mais nada, exceto sentar: ouvir uns poucos carros passando ao longe. Sentir o ar frio noturno. Apreciar as mudanças que se processavam em seu corpo. 
Mushin sentou a noite inteira e, com o raiar do dia, ouviu o ruído do Trem. Então, muito devagar, este acabou parando exatamente em sua frente. Foi quando percebeu que desde o início tinha estado no Trem. Aliás, ele era o próprio Trem.
Não havia necessidade de pegá-lo. Nada a compreender. Lugar algum aonde ir. Apenas a totalidade da própria vida. Todas as antigas questões que não eram questões se respondiam por si. Finalmente, o Trem evaporou e havia apenas um velho sentado noite afora.

Mushin espreguiçou-se e levantou-se da almofada. Saiu para preparar o café que compartilharia com quem estava chegando para trabalhar.
A última vez em que o viram foi na carpintaria com alguns dos meninos mais velhos, construindo um balanço para o parquinho. Essa é a história de Mushin.
O que Mushin descobriu? Deixarei que vocês mesmos respondam.

           
 Extraído do primeiro livro de Charlotte Joko Beck: "Sempre Zen - Como introduzir a prática do Zen em seu dia a dia" A parábola de Mushin

Que possam os méritos alcançados com a leitura deste texto serem transferidos para todos aqueles que ainda vivem na ilusão de que a verdade se encontra fora e não dentro.
 
Getulio Taigen

Rede de Indra

domingo, 28 de agosto de 2011

O Butsudan

Butsudan - O Altar de Buda
O Altar de Buda ou Butsudan pode ser feito numa mesa simples ou num altar tipo escada, de três andares.
Pode ser colocada uma toalha de mesa (pode ser branca), esta deve estar bem posicionada, centralizada.
A imagem principal (Honzon) da Escola Soto Zen é a do fundador do Budismo, Shakyamuni Buda.
A imagem do Thatagata fica no centro da prateleira superior, no coração do altar.
Esta área representa o Monte Sumeru (a montanha que está no centro da cosmologia Budista) e no centro dessa área fica a imagem principal.
A ambos os lado da imagem de Shakyamuni Buda colocamos as dos dois fundadores da
Escola Soto Zen no Japão, Dogen Zenji (ao lado direito de quem olha) Keizan Zenji (ao lado esquerdo).
Oferta de água é colocada no centro da prateleira do meio.
A água deve ser trocada diariamente.
Na prateleira mais baixa do altar de Buda, coloque o vaso de flores, o incensário e o castiçal.
Os três na mesma linha. Os incensários possuem uma parte fronteira e uma traseira determinadas.
Se o incensário se apoiar em três pés, um dos pés deve estar na frente.
Antes do inicio do zazen ou da cerimônia, colocamos um incenso de espera (terço posterior do incensário).
Os incensos devem estar bem centralizados.
Em caso de termos um castiçal, este vai à direita de quem olha e as flores à esquerda.
Se tivermos dois castiçais, estes ficam entre as flores e o incensário.
Alternativamente, as flores podem ficar alinhadas com a água.
O Mokugyo (literalmente Peixe de Madeira, um instrumento de percussão) coloque-o à direita (de quem olha), e o(s) sino(s) à esquerda.
Caso tenha apenas o sino, coloque–o a sua direita.
O mesmo formato usamos para o altar de Manjurseri Bosatsu.
Muito importante que o altar este sempre limpo e em ordem, respeitando o equilíbrio e a harmonia.
Lembre de trocar a água das flores assim como retirar os restos de vela do altar e dos castiçais.
Os incensários devem ser limpos diariamente.
Manter o altar limpo e em ordem faz parte da nossa prática.
Mostra nossa atenção e a dedicação e o respeito com a prática e com os outros.
Adaptado das informações do site: www.sotozen-net.org.jp 

Os 4 Esses

SAN ZEN DOJO - GIRI, GAMAM, GANBARU E GISEI

 O Bushido e o Zen, influenciaram todos os aspectos da vida japonesa, suas crenças filosóficas e espirituais, sua etiqueta, sua vida familiar, sua maneira de vestir, de pensar, seu trabalho, seu senso de estética e sua forma de se divertir.
Essa influência se deve a 4 princípios derivados dessas artes, chamados de os Quatro G (s). 
1-  Giri: Significa obrigação, dever.
Esse princípio liga as pessoas a tipos e graus específicos de obrigações com seus professores, mentores e superiores hierárquicos. Giri trás um profundo senso de honra e orgulho e, aqueles que recebem o Giri (professores, mentores e superiores), sacrificam sua vida pessoal a serviço aos seus subordinados.
Se alguém faz qualquer coisa para vc, vc começa a carregando uma obrigação ou como se diz no Japão (On).Um ON (dever ou obrigação) pode ser bom ou mal. Pode ser uma coisa grande ou ate mesmo insgnificante, como um amigo que trás para vc um presente de uma viagem, ou um insulto a sua honra.
Como não deixar de cumprir com todsa as suas obrigações decorrentes da quantidade de On acumulado? Talvez o amigo que lhe tenha presenteado, nem se lembre mais do ato, então pq se preocupar com isso? Pq isso o transforma num ser especial, pq faz com que vc transceda os valores mundanos de ganho e perda. Assim se comportando, vc passa a ser alguém que se pode confiar, não 99.9% do tempo, mas 100% do tempo. o conceito de Giri demanda que todas as obrigações devem ser pagas e, os seus sentimentos pessoais nesta questão são completamente irrelevantes. Não importa que você não tenha pedido o presente, talvez nem tenha gostado do presente, mas vc acumulou On e o Giri te obriga que essa obrigação seja correspondida. Um velho provérbio japonês diz:  “A morte é mais leve que uma pena de pombo, se comparada ao Giri que é mais pesado do que uma montanha”. 

2- Gamam Kurabe: Significa teste de perseverança ou resistencia a dificuldades.
Gamam kurabe é aplicado a qq coisa, com o objetivo de perseverar ate que a maestria seja alcançada e superada. É o pensamento de nunca disistir, de se esforçar sempre ao máximo para que algo possa ser realizado da forma mais correta e perfeita.
É suportar o insuportável, ou chegar bem perto disso. Um ditado japones diz: "Ki ga susumanai - Meu espirito nunca esta satisfeito", querendo dizer que sempre podemos fazer melhor, sempre podemos perseverar para que o trabalho saia mais perfeito.
No Japão antigo os meninos com idade de 7 anos eram entregues aos professores e com eles estudavam ate a idade média de 30 anos. O treinamento mais importantes era o de nunca desistir, de tentar aumentar e melhorar suas habilidades e nunca se sentirem satisfeitos com o grau que houvessem alcançado. 

3- Ganbaru: Significa, segurar-se, manter-se firme, continuar tentando, mesmo que tudo esteja dando errado.
No idioma japones existem as palavras e frases, que bem explicitam esse assunto, tais como: ganbarimasu - eu não desistirei, ganbarimashou - nos não vamos desistir, ganbate imasu - continue tentando, não esmoreça.
Um ditado japones: "Não se faz uma espada acariciando um pedaço de ferro"
É comum praticantes de Zen desistirem depois de um certo tempo de prática, achando que o esforço não vale a pena, que o caminho é muito íngreme, que os resultados são muito pequenos etc. mas o valor do sucesso depende em muito de seu esforço em alcança-lo, desisitir frente a qq dificuldade, não constrói um caráter inamovivel, inabalável.
A capacidade de manter-se firme mesmo perante as maiores dificuldades nos capacita a superar todas as dificuldades, sejam elas quais forem e, encontra paralelo na cultura ocidental, conforme se pode observar no poema de Ruduard Kipling. 
" Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas, em armadilhas as verdades que disseste
E as coisas, por que deste a vida estraçalhadas, e refazê-las com o bem pouco que te reste.
Se és capaz de arriscar numa única parada, tudo quanto ganhaste em toda a tua vida.
E perder e, ao perder, sem nunca dizer nada, resignado, tornar ao ponto de partida.
De forçar coração, nervos, músculos, tudo, a dar seja o que for que neles ainda existe.
E a persistir assim quando, exausto, contudo, resta a vontade em ti, que ainda te ordena: Persiste!"  

- Gisei: Significa sacrifício, em favor da comunidade.
Devemos sempre levar em conta a felicidade e a tranquilidade do grupo, o ganancioso pensamento individualista, produz muito sofrimento e dor e, esta dor acabará reverberando em nós mesmo. A meta é conseguir unificar corpo e mente a tal ponto que não exista nenhuma diferença entre pensar alguma coisa e coloca-la em prática. Esse estado mental é chamado de Mushin ou Munen e significa, "sem mente", isto é, a mente se torna vazia de conceitos de bom ou ruim, de suportável ou insuportável, de tal forma que não intefere nas ações do corpo, apenas existe o trabalho a ser feito e o esforço de chegar a perfeição em qualquer ação.
Se todos numa comunidade pensarem assim, o trabalho fica dividido de forma equanime entre todos os membros do grupo, não exarcebando um em detrimento dos outros, a comunidade cresce, o esforço é diluido entre os membros e todos podem se beneficiar do sacrifício coletivo.

As Seis Paramitas

Os Seis Paramitas - Rokudo
(Roku - seis, Do - caminho espiritual)
1. GENEROSIDADE.

2.
PRECEITOS, CONDUTA APROPRIADA.

3.
PACIENCIA.

4.
ESFORÇO, ENERGIA.

5.
MEDITAÇÃO.

6.
SABEDORIA, PRAJNA.

Os sutras da Perfeição da Sabedoria (prajna-paramita) e o Sutra do Lótus (Saddharmapundarika) fazem referência as "Seis Paramitas" ou As Seis Perfeições.

A palavra paramita significa "ir para a outra margem", são como um bote que usamos para atravessar o rio do samsara.
As paramitas são também chamadas ações transcendentes porque são baseadas em dar um passo além das noções convencionais de virtude e não-virtude. Elas servem para irmos completamente além das limitações da visão dualista e para desenvolvermos uma mente flexível.
O termo sânscrito "paramita" é usualmente traduzido por perfeição, na
escrita chinesa é escrito com um ideograma que se traduz literalmente por "atravessando para a outra margem".

1-
GENEROSIDADE - É a primeira perfeição.

A primeira paramita é a generosidade, a doação. Sempre que sentimos medo, nos apegamos as coisas, sejam elas bens materiais ou imateriais. Temos medo de perder, seja lá o que for, segurança, tranqüilidade etc, temos medo de ser feridos, temos medo do sofrimento.

A falta de generosidade causa enorme sofrimento e medo.
Quando conseguimos nos desapegar, o medo começa a se dissolver por si só.
A idéia básica da generosidade é treinar para pensar grande, fazer a nós mesmos o maior favor do mundo e parar de cultivar apegos desnecessários.
Quanto mais experimentamos a riqueza mental, mais conseguimos abrir mão de nosso apego. Essa riqueza mental está disponível a cada momento.
A chave está em compreender que tudo é impermanente, entender que ninguém pode ser feliz sozinho, que não adianta você ser rico, enquanto pessoas ao seu redor morrem de fome...
Quando formos capazes de dar sem esperança de retorno, nem dualizar, mas apenas fazendo o que tiver que ser feito, estaremos caminhando a passos largos para a felicidade.
Nada nos pertence... Pertence ao mundo, apenas está em nossa posse por algum tempo, mas dia menos dia retornará ao mundo.
estando ali muito diretamente, encontramos a riqueza mental por toda parte.
Gotas de chuva e nas gotas de sangue, melancolia e prazer, nada nos pertence , sejamos como o sol que brilha para tudo e todos sem discriminação, como um espelho, que reflete qualquer coisa sem aceitar ou rejeitar.
A paramita da generosidade consiste em conectar-se com o ato de dar, apreciando esse ato profundamente.
devemos tirar nossos óculos escuros, nossos casacos compridos, nossos capuzes e disfarces, vamos nos abrir e permitir sermos tocados
Dar bens materiais pode ajudar as pessoas. Se forem necessários alimentos e podemos dá-los, fazemos isso. Se são necessários abrigos, livros ou remédios e podemos dá-los, fazemos isso.
Da melhor forma possível, cuidamos de qualquer pessoa que precise de nós.

Entretanto, a verdadeira transformação ocorre quando abandonamos nosso apego e nos desfazemos daquilo que julgávamos impossível dar. As atitudes tomadas no nível mais exterior têm o poder de desfazer padrões profundamente enraizados de apego a si mesmo.

Também podemos dar de presente o dharma. Na medida em que somos capazes, damos instruções sobre meditação. Mostramos livros e fitas, avisamos sobre palestras e sessões de prática.
Damos às pessoas ferramentas para que descubram por si mesmas o que nos encorajou a soltar nosso apego, o que nos encorajou a pensar grande.

2-
OS PRECEITOS - O COMPORTAMENTO ÉTICO é a segunda perfeição.

A essência deste paramita é que através da observação dos preceitos não prejudiquemos os outros. A conduta ética é a base para progredir no zen e para atingir todas as maiores realizações no caminho.

A primeira paramita - generosidade, deve ser sempre apoiado pela ética, não devemos confundir ética com moral, que se altera a cada momento histórico.
Devemos aperfeiçoar nossa conduta, não regrando as sementes do mal em nossa mente.
Abster-se de matar, roubar, conduta sexual incorreta, mentir, falar mal dos outros, Seguir os preceitos ou orientações não deve ser um fardo, mas sim uma alegria. Seguimos estes preceitos, para que possamos desfrutar de maior liberdade, felicidade, e segurança em nossas vidas, pois através do nosso comportamento não criamos sofrimento para nós ou para o mundo.
Praticar esse paramita é manter a mente livre da raiva, da cobiça e da ignorância.
Quando nos esforçamos para manter esse segundo paramita, também estamos praticando o primeiro. Quando vivemos com consciência, estamos oferecendo algo muito importante para o mundo.
"A moralidade age como uma cerca, mantendo todos os animais selvagens e destrutivos de nossas emoções negativas longe de nosso jardim interno de Buda".

3-
PACIÊNCIA é a terceira perfeição.

O poder da paramita da paciência é que ela representa um antídoto contra a raiva, um meio para aprender a compreender, apreciar e aceitar tudo aquilo que encontramos no caminho.

Paciência não significa resignação - suportar estoicamente algo. Em qualquer situação, em vez de reagir rapidamente, movido pela emoção, podemos relaxar, abraçar a situação, mastigá-la, sentir seu cheiro, olhar para ela e estar abertos para ver o que realmente está acontecendo ali.
O oposto da paciência é a agressão - o desejo de reagir, de responder, de contra-atacar.
O cultivo da paciência envolve calma, tranqüilidade, observação.
A paciência é a paramita que permite enfrentar os desafios e dificuldades da vida sem perdermos a equanimidade, o centro do equilíbrio. Com a observação dessa paramita conseguimos não nos aborrecermos com as críticas e os mal-entendidos nem nos envaidecermos com os elogios e o puxa-saquismo.
Essa virtude que devemos desenvolver, não é a aceitação simples ou a supressão de nossos valores, mas a compreensão das diferenças de compreensões sobre a vida.
Devemos nos esforçar para ver sempre o lado bom e a beleza em tudo e em todos, não devemos nos cansar de tentar ajudar os desafortunados atravessarem o rio do sansara.
Praticar essa paramita é manter a paz interior, a calma e a serenidade em todas as circunstâncias, ter paciência e tolerância conosco e com os outros.
Essa paramita ajuda a outra. Com a força da paciência, não perderemos o foco de nossa prática.

4-
ESFORÇO - ENERGIA é a quarta paramita (tb chamado de disciplina).

É necessário um grande esforço para disciplinamos qualquer forma de fuga potencial da realidade. A disciplina nos permite estar aqui e agora, sem desvios.

O que torna a disciplina livre de severidade é a sabedoria (prajna). A disciplina fornece o encorajamento que nos permite continuar na prática, que nos permite ir pouco a pouco, desconstruindo nossos dolorosos padrões habituais.
Um bom exemplo de esforço correto é uma sessão de zazen, sentamos em uma determinada posição e permanecemos tão atentos quanto for possível. Atravessamos, durante um período de zazen, continuadamente alterações de humor, lembranças, dramas e tédio e dores.
É necessário um esforço genuíno para prosseguimos com nossa prática, com esse paramita conseguimos encontrar o equilíbrio entre não estar nem muito tenso nem muito distendido, nem muito relaxado nem muito rígido.

A essência deste paramita é ter a coragem, a energia e a resistência necessária à contínua prática do Darma e perseguir o objetivo supremo da para dar continuidade a prática zen, sem esse paramita, podemos nos desiludir e largar a prática quando estivermos sob condições adversas.


5-
MEDITAÇÃO (zazen) é a quinta paramita.

Essa paramita é que nos permite continuar a jornada. É o alicerce para uma sociedade iluminada que não está baseada em vencer ou ser derrotado, em ganho ou perda.

A meditação é, provavelmente, a única atividade que não acrescenta nada ao cenário.
Tudo pode vir e ir, sem maiores floreios, é uma ocupação completamente não-violenta, não-agressiva.
Fazer zazen, não é entrar em algum estado de transe, de bem-aventurança ou de absorção de alguma coisa, é estar completamente desperto para as situações da vida como elas são, particularmente cônscio da continuidade ininterrupta da mente.
Meditar em tibetano significa literalmente "tornar familiar". Por meio do zazen nos familiarizamos com a realidade da vida.

6-
SABEDORIA (prajna) é a sexta paramita.

A sexta paramita é a sabedoria, a capacidade de compreender, d entender, de viver com inteligência. As outras cinco paramitas são indicativos, são referências. O prajna nos transforma em desabrigados. Não temos nenhum lar, é a espada que corta nossos apegos, que nos faz ver as coisas como elas realmente são: impermanentes, insatisfatórias e impessoais. Com a sabedoria, não precisamos mais lutar, não é preciso mais morder ninguém, não é mais necessário tomar qq tipo de partido, pois um lado, sempre inviabiliza o outro, quando não se toma partido, podemos ver os lados da moeda.

Às vezes, sentimos uma enorme saudade de nossos velhos hábitos. Quando trabalhamos com a generosidade, percebemos nossa nostalgia pelo desejo de apegar-se.
Quando observamos tudo com sabedoria, podemos perceber as repetitivas vezes que nos afastamos do caminho, com essa sabedoria eliminamos as emoções conflituosas. Não existem erros ou acertos, mas sim experiências.
Perguntas refletem a nossa ignorância; respostas, a nossa sabedoria. Quando em nossa mente não houver mais perguntas, apenas respostas, estaremos iluminados.
Para adquirirmos a sabedoria, necessitamos possuir a mente aberta, precisamos ter a coragem de abrir mão da segurança dos nossos conhecimentos adquiridos e estabelecidos, precisamos nos desapegar de quaisquer coisas. Buda ensinou que devemos nos desapegar de qualquer coisa que esteja bloqueando a sabedoria.

 

Eihei Dogen.

Eihei Dogen - O Patriarca da Escola Soto Zen do Japão
Dogen Kigen, Conhecido como Eihei Dogen Sama por causa de um templo, o Eihei-ji, ou Templo da Eterna Paz, viveu de 1200 à 1253 e foi provavelmente uma das mais brilhantes mentes que o budismo japonês já produziu. Mestre magnânimo que viveu profundamente o que ensinou, Dogen procurou emancipar os homens dos grilhões da avareza, do ódio e da ilusão, ensinando-os a viver uma existência verdadeiramente significativa baseada unicamente no caminho de Buda, e nunca procurou formular um sistema de pensamento especulativo.
O Shobogenzo, que consiste de 95 capítulos, foi escrito num período de 25 anos e concluído pouco antes de sua morte. Nele Mestre Dogen trata de assuntos tão simples e aparentemente corriqueiros como a maneira precisa de praticar a higiêne na vida monástica, e outros de tão alta metafísica como a relação do tempo e do ser com a prática da iluminação.
Toda a forma de expressão de Mestre Dogen é singular, e pode sem dúvida alguma ser atribuída à qualidade de sua iluminação, que muitos afirmam ser uma das mais penetrantes do Budismo, assim como sua mente naturalmente brilhante e altamente criativa. Nos círculos Budistas mais eruditos, diz-se que os capítulos mais difíceis do Shobogenzo são a Montanha Fuji do Budismo Zen e aqueles que conseguem chegar ao seu pináculo tem que ter aberto o olho do Dharma.
Mestre Dogen nasceu em Kimata (Tóquio - Japão), filho de família aristocrática, contava somente com três anos de idade quando viu falecer seu pai e apenas oito anos quando também viu sua mãe falecer. Durante o funeral materno, consumido em pranto e dor, ao observar a fumaça do incenso elevar-se, percebeu claramente a natureza impermanente de todos os fenômenos. Neste exato instante decidiu dedicar sua vida à busca do caminho de Buda, conforme era a vontade de sua mãe.
Com o falecimento de seus pais, o pequeno Dogen ficou sob a custódia de um tio. Ao chegar a idade de 12 anos, solicitou autorização para seguir vida monástica, conforme tinha sido sua decisão nos funerais de sua mãe. Apesar de alguma relutância, pois seu tio pretendia introduzir Dogen na política, ao perceber a força de vontade e firme determinação daquele jovem órfão acabou por conceder a autorização. Mestre Dogen recebeu finalmente os preceitos e a ordenação de monge budista. E assim iniciou um caminho que só traria benefícios para o mundo.
Eihei Dogen era um jovem naturalmente inteligente e estudioso, no decorrer de sua prática monástica leu repetidamente os textos e sutras, tanto da escola Tendai como os da escola Rinzai. Não obstante ter se tornado um profundo conhecedor da doutrina budista, Dogen Sama permanecia com uma dúvida que o atormentava. "Se é ensinado que todos os seres possuem a natureza de Buda, porque é necessário buscar o despertar através da intensa prática". Atormentado por esta dúvida e não conseguindo encontrar explicações convincentes, resolveu viajar a China em busca do conhecimento original.
Em fevereiro de 1223, partiu do Japão acompanhado de seu professor, Monge Myozen rumo à China. Após uma perigosa e árdua viagem, aos primeiros dias de abril chega a China.
Dogen Sama começou a visitar todos os templos e mosteiros possíveis. Efetuando entrevistas com vários mestres renomados e monges veteranos. Viajou ao Monte Tendo e praticou exaustivamente, porém suas dúvidas continuavam. Ao mesmo tempo em que estudava com outros professores, sentia-se um pouco decepcionado com o nível de compreensão espiritual dos monges com quem travara contato, mas mesmo assim continuava a procurar.
Certo dia, sabedor que no Monte Tendo, havia chegado um novo Mestre de nome Nyojo que tinha assumido o mosteiro em razão da morte do antigo Mestre de nome Musai, decidiu retornar aquele Templo para conhecer o novo Mestre e quem sabe ter respondida a sua pergunta.
Quando se encontraram, imediatamente, Dogen Sama reconheceu no Mestre Nyojo o professor que tanto buscava e, Mestre Nyojo em Dogen Sama o discípulo que tanto ansiava encontrar.
Uma certa noite, durante à prática do zazen, um monge que praticava ao lado de Dogen Sama dormiu. Mestre Nyojo, percebendo o deslize do discípulo, bateu-lhe com uma de suas sandálias ao mesmo tempo em que gritava - "Abandona o corpo e o espírito". Neste momento, às dúvidas de Dogen Sama desapareceram totalmente. Ao término do zazen, dirigiu-se a habitação do mestre e após queimar incenso, ajoelhou-se.
- Para que isto? Perguntou Mestre Nyojo.
- O corpo e a mente foram abandonados, respondeu Dogen Sama.
Percebendo que a compreensão de Dogen Sama havia sido absoluta, Mestre Nyojo, confirmou seu despertar.
Dogen Sama, permaneceu mais dois anos praticando junto ao Mestre Nyojo. Quando se preparava para voltar ao Japão, Nyojo lhe concedeu o "Selo da Transmissão" e lhe disse:
"- Quando chegares ao teu país, trabalha pela iluminação de todas as criaturas da terra." Após o que lhe entregou o O-Kesa (Manto Sacerdotal) que havia pertencido ao Mestre Fuyo Dokai.
Ao chegar ao Japão, Dogen Sama iniciou um duro trabalho para introduzir o autêntico Dharma Budista, tal como havia aprendido com seu mestre. Sua primeira obra escrita foi o Fukanzazengui (Instruções para a difusão universal dos princípios do zazen). No ano de 1244, funda o que seria o centro mundial da Escola Soto Zen, o Monastério Eiheiji (O Templo da Paz Eterna). No ano de 1253, após nomear seu discípulo Monge Koun Ejo como seu sucessor, morre na noite de 28 de Agosto, deixando para o benefício de todos os seres, uma das formas mais refinadas e autênticas do Dharma de Buda.

Zen Budismo - História e desenvolvimento.

O termo japonês Zen (em chinês Ch'an) é a forma abreviada de Zenna, derivado do chinês Ch'an-na, que por sua vez vem de Dhyana (meditação em sânscrito). Em coreano, é chamado de Soen; em vietnamita, chama-se Thìên.

O buddhismo Zen é baseado na idéia de que, já que todos os seres sencientes têm uma natureza búddhica, para atingir a iluminação é apenas necessário descobrir este buddha interior. Enganam-se porém, as pessoas que muitas vezes acreditam que este "descobrimento" da natureza búddhica interior pode ser atingido sem trabalho. A prática Zen real é muito disciplinada e muitos anos de estudo devem necessariamente preceder a liberação "súbita" na verdade.

Apesar de para os menos avisados, parecer o contrário, o Zen, como todas as escolas do buddhismo, tem uma base racional. Não depende nem da fé nem de dogmas petrificados, mas somente da experiência direta e da observação sem preconceito. Como uma escola buddhista, contudo, o Zen tem seu alicerce nos insights comuns a todas as outras linhagens. Essa base comum repousa na experiência. Isto é, naquela área onde a ciência e o misticismo se encontram. A única diferença entre esse dois campos de experiência é que a verdade da ciência  sendo dirigida aos objetos externos  pode ser provada de maneira "objetiva", ou melhor, demonstrada, enquanto o misticismo, dirigido ao sujeito, pertence à experiência "subjetiva". O Zen, como todas as escolas buddhistas, se mantém à parte das opiniões pré-concebidas, dogmas e artigos de fé, juntamente com tudo que normalmente recebe o nome de "religião".

A Origem do Zen

Segundo a história tradicional, a primeira transmissão mente a mente (ou coração a coração) ocorreu na Índia, durante uma palestra de Buddha a uma grande assembléia na montanha Gridhrakuta, que reunia mais de mil e duzentos discípulos.

O Buddha Shakyamuni, com um sorriso inspirador em sua face, elevou o braço, segurando apenas uma flor de lótus dourada. Neste momento, houve um silêncio total.

Nenhum dos discípulos arriscou-se a dar nenhuma interpretação e, durante esse longo momento de impasse, seu discípulo Mahakashyapa (famoso por sua extrema sisudez) respondeu-lhe com outro sorriso misterioso. Ninguém da assembléia entendeu o sentido e significado do feito de Buddha e, mais tarde, ele anunciou que o mais profundo Dharma da verdade tinha sido transmitido ao discípulo Mahakashyapa.

O Desenvolvimento

Desde então, durante vinte e oito gerações (quase mil anos), ocorreu essa transmissão de "mente a mente". Até que Bodhidharma (em jap. Bodai Daruma, 470-543), um patriarca indiano, levasse essa tradição à China, durante a dinastia Han.

Em 527, o patriarca fundou a escola de Dhyana dentro do templo Shao-lin, como uma escola diferenciada do buddhismo e que veio a se consolidar mais tarde. A palavra Dhyana foi traduzida para o chinês como Ch'an-na ou abreviadamente Ch'an (Zen, em japonês), que é o estado que propicia quietude da mente, desapego em relação à nossa preocupação e às necessidades imediatas. O Ch'an se desenvolveu rapidamente na China, tornando-se, dentro do buddhismo, um ramo independente do pensamento filosófico, tendo exercido influência nas artes, na cultura e nos costumes chineses.

Seu enfoque está na compreensão imediata, no despertar interior, transpondo toda barreira lógica dualista e as regras impostas pelo padrão religioso e cultural. As sutilezas da poesia e da pintura chinesa carregam exatamente o brilho do Zen.

O Chan (Zen) chega ao Japão

Durante o período Kamakura (1185-1333), o buddhismo Ch'an foi introduzido no Japão, onde passaria a ser chamado de buddhismo Zen. Em 1191, o monge japonês Myôsan Eisai (ou Yôsai, Zenko Kokushi, 1141-1215) levou a linhagem Lin-chi da China para o Japão, onde passou a ser chamada de Rinzai. Em 1227, outro monge japonês, Eihei Dôgen (ou Shôhyô Daishi, 1200-1253) levou a linhagem chinesa Ts'ao-tung, que passou a se chamar Soto em japonês.

A linhagem Rinzai tornou-se popular entre os samurais, shôguns e aristocratas, influenciando o código de honra dos guerreiros ou Bushido. Atualmente ela possui nove subdivisões e conta com aproximadamente 7 mil templos e monastérios. Já a escola Soto, foi difundida principalmente entre os camponeses graças ao trabalho do monge japonês Keizan Jôkin (1268-1325). Hoje, a escola Soto tem nove subdivisões e possui aproximadamente 14 mil templos e monastérios.

O Zen Budismo no Brasil

O Budismo chegou ao Brasil na década de trinta, trazido pelos primeiros imigrantes chineses, japoneses e coreanos. E o fato de sua chegada ter sido um tanto tardia, propiciou uma situação única e bastante promissora, pois o Zen Brasileiro encontrou um terreno limpo, sem as influências encontradas nos países que já o praticam há muitos séculos e que por isso, acabaram por adaptar a doutrina às suas próprias culturas e necessidades.

Tendo a plena consciência do quão benéfico pode ser aos brasileiros, o aprendizado e a prática de acordo com os ensinamentos originais deixados por Shaquiamuni Buddha, os sacerdotes que atuam no país, têm-se esmerado para semear o solo fértil que se apresenta, com as sementes mais puras que conseguiram obter, através dos muitos anos de estudo e práticas.

Os Quatro Estados da mente.

Os Quatro Estados da Mente

Taigen

Mente Comum, Contemplação, Concentração e Meditação

Contemplação significa pensamento dirigido, direcionado. O leigo pode até achar que a mente em estado de contemplação é a mesma em estado de pensamento comum, mas não é verdade. O pensar da mente comum é vago, desgovernado, não começa nem acaba em nenhum lugar. A mente comum funciona por associações. Um pensamento levando a outro, sem qualquer comando de sua parte. A mente comum, deste modo, de associação em associação navega livre e louca sem qualquer direção, como um navio desgovernado num oceano bravio. Por exemplo: de repente, você vê um gato atravessando a rua, lépido como só os felinos sabem ser. No exato momento em que você estabelece contato visual com o gato, sua mente comum, começa automaticamente, a pensar a respeito de gatos. A visão do gato captura e conduz sua mente, por meio de associações relacionadas a lembranças passadas.

Quando você era criança talvez gostasse (ou não) de gatos, a partir do momento em que você estabeleceu contato com o gato, todos o fato relacionado a gatos de sua infância vem a sua mente (como se você acessasse um arquivo específico na sua memória) e, por associação você começa a lembrar-se de coisas acontecidas durante seus contatos ao longo de toda a sua vida com os gatos, nesse meio tempo o gato acaba sendo esquecido, pois sua mente comum já se encontra completamente ligada a outras lembranças que por sua vez lembram outras e assim por diante. Desta maneira o tempo passa, e de associações em associações você vai levando a vida. (acreditando piamente que está vivendo plenamente).

Se qualquer outra pessoa tivesse cruzado a rua com o mesmo gato, a associação mental seria completamente diferente, pois as experiências ao longo da vida foram diversas. Todo mundo possui elos associativos na mente. Não existe nenhuma relação entre dois ou mais pensamentos. Trata-se apenas de associação de um pensamento a outro, e, eles conduzem a si próprios. Ou melhor, você é conduzido, levado de roldão pelos pensamentos associativos, de lá para cá como um peixe fora d’água.
Não há nesta associação nenhuma conexão lógica ou estudada, apenas e tão somente associações desgovernadas. Todo mundo tem. Qualquer acontecimento por mais banal que possa parecer o empurra para outros pensamentos e, um pensamento leva a outro, a outro a outro e assim sucessivamente por toda a sua vida até que você interrompa essa sua existência tão fútil.

O pensamento comum transforma-se em contemplação quando não acontece através da associação, mas sim quando é dirigido. É quando você está trabalhando em um sério problema e isola todas as associações. Você passa a tratar apenas desse problema em particular. A mente, sempre nervosa e agitada, tentará escapar dessa prisão, para algum tipo de associação. Você não deixa, corta todas as amarras, todos os atalhos, permite somente que sua mente ande numa única direção.
Um cientista, trabalhando em um complexo problema, está em contemplação. Um pintor, desenhando um quadro, está em contemplação. Um universitário estudando química está em contemplação. Neste momento, o mundo todo é suprimido e apenas o cientista e seu trabalho, o pintor e a pintura, o estudante e seus livros permanecem. No decorrer do processo contemplativo, muitas coisas paralelas o atrairão. Não permita que sua mente se distraia ou se desvie. Só permita que ela se mova em uma direção, em uma linha única. Isto é contemplação. Qualquer pensamento lógico é contemplativo. O pensamento comum é louco, solto, absurdo.

A contemplação é lógica, racional.
Já a concentração é permanecer em um só ponto. Não é contemplar, não é pensar. É estar com a mente direcionada em uma única coisa, sem permitir que a mente se mova. No pensamento comum a mente se move como um peixe fora d’água. Na contemplação, a mente louca é direcionada, dirigida. Na concentração, a mente não tem permissão para se mover. No pensamento comum, a mente se move para onde quer. Na contemplação ela se move para um lugar determinado/direcionado. Na concentração, ela não se move, fica estacionada em um único ponto.
Entretanto, na meditação, nenhuma forma de amarra, direcionamento ou focalização é permitida. A meditação é não-mente. Na concentração, a mente tem licença para existir em um ponto único. Na meditação até mesmo esse ponto e retirado, ela situa-se além do pensar e do não pensar. No pensamento comum, todas as direções estão abertas. Na contemplação, apenas uma. Na concentração apenas um ponto está aberto (sem nenhuma direção). Na meditação nada existe, nem a mente, somente o momentum “aqui e agora”. O pensar comum é o estado da mente normal. A meditação é o outro lado da margem, a maior conquista que um homem pode almejar.
Tentemos compreender: o que está acontecendo neste momento em sua mente? Está acontecendo um processo ininterrupto de pensamentos! Se você conseguir diminuir um pouquinho essa pantomima mental, aos poucos, lentamente chegará a não-mente. Mente significa pensamento; não mente significa, naturalmente, não pensamento. Se através da prática assídua, seu processo de pensar, seus pensamentos estiverem se tornando mais densos, enchendo sua cabeça, dificultando sua vida, deixando você distraído, esquecido, então você estará indo à direção contrária da não-mente. Se o processo de pensar torna-se menos denso, se é diminuído, desacelerado, se você está mais alerta, dormindo melhor, lembrando-se das coisas, você está no caminho certo, está dirigindo no caminho da não-mente. Depende somente de você. A mente pode ser um grande auxílio. A mente é aquilo que você estiver fazendo agora. Se você estiver vivenciando a experiência deste exato momento, então você está na não-mente.

Devagar, gradativamente, através do treinamento, você vai diminuindo a quantidade de pensamentos em sua mente. Se apenas um por cento for retirado, sobram noventa e nove por cento de pensamentos. É, como se você estivesse retirando móveis sujos, velhos, quebrados e sem serventia de sua sala revestida com piso de ouro do mais alto quilate e lustres de pedras preciosas. Quando você inicia (com muito trabalho e determinação) a retirar a sujeira de sua sala, começa a aparecer espaço. Quanto mais lixo você retirar, mais espaço você vai ter. Quando após muito esforço conseguir tirar toda a sujeira, a sala se tornará só espaço (vazio). O espaço não foi criado pela retirada dos móveis (leia-se pensamentos) o espaço sempre esteve aí.

Se você retira alguns pensamentos, ou usando uma linguagem mais atual, Quando você deleta alguns arquivos inúteis, o espaço é criado, descoberto, recuperado. Se continuar removendo os pensamentos, aos poucos irá recuperando seu espaço original e acabará vendo a verdadeira face de Deus (Ou como era seu rosto antes de seus pais nascerem). Esse processo chama-se meditação.

A mente é como um grande disquete lotado de arquivos. O que fazemos, é ficar repetindo os mesmos pensamentos todos os dias. Você é como um disco velho (daqueles antigos, arranhados de rotação 68) que fica repetindo todos os dias a mesma coisa, apenas por hábito, por condicionamento, apenas por que você está costumado. Isso não é de todo mal, os velhos hábitos ajudam. Se uma criança está chorando e não consegue dormir, a mãe lhe dá uma chupeta, ela para de chorar e dorme. Então, depois dela dormir, a mãe pode retirar a chupeta. Mas se ela não lhe der a chupeta, ele não dormirá, ou pelo menos demorará muito mais. É um condicionamento, no momento em que a chupeta lhe é dada, um tipo de mecanismo é acionado em sua mente, e a criança se sente confortável e dorme tranqüila.

O mesmo acontece com você. Não se trata mais de uma simples chupeta, mas basicamente, o princípio é o mesmo. Talvez você sinta dificuldade para dormir em um quarto diferente, em uma cama diferente, sem roupas ou com roupas diferentes das que está costumado, usar um banheiro diferente. Na verdade não existe relação entre a maneira de dormir e o sono propriamente dito, mas para sua mente sim. Existe o condicionamento. E, com velhos hábitos você se sente melhor, você se sente confortável, como se estivesse entre amigos. Os mesmos pensamentos todos os dias, a mesma rotina, você sente e acha que está tudo bem.
Afinal, é tudo tão estranho! (tudo muito novo, e ninguém gosta muito de novidade, ninguém gosta de mudar) Você investiu muito nos seus pensamentos, gastou anos acumulando “coisas” em sua mente e agora não se sente bem em joga-las fora. Esse é o grande problema, você é como um mendigo empurrando um caminhão de coisas inúteis. Mas se você tiver coragem, começará a perceber (com muita satisfação) a quantidade de inutilidades que você anda guardando em sua mente e como isso põe você prisioneiro de você mesmo, começará a perceber a alegria do “espaço” e a sentir a beleza que ele contém, a grande satisfação que ele começa a lhe proporcionar.

Recapitulando, (parece até apostila de faculdade) do pensamento comum, passa-se a contemplação, depois, vem a concentração e da concentração a meditação. Movendo-se devagar, você vai percebendo as mudanças dia a dia e quanto mais você percebe, mais compreende o quanto é ridículo continuar carregando o barco nas costas, centenas de quilômetros depois de ter atravessado o lago. Ora, você é um ser humano e não um caramujo então para que ficar guardando pensamentos, coisas que aconteceram anos atrás.

É, o assunto é complicado mesmo. Sempre que tratamos de coisas abstratas, fica muito difícil explica-las à luz da razão e da lógica. Entretanto, ficará bem mais compreensível e fácil de ser entendido com a prática, somente através da experiência da meditação (zazen) é que você conseguirá entender todo o processo associativo que formam os nossos pensamentos. Aí então serás livre para fazer, falar e ser o que quiser.

A Discussão é inútil e o Zen é pop.

A Discussão é Inútil e o Zen é pop.



“Se o adversário é inferior a ti, porque brigar;

Se o adversário é superior a ti, porque brigar;


Se o adversário é igual a ti, compreenderá o que tu compreende;


Então... não precisará haver luta.”

Todos os debates são inúteis, o próprio debater é uma idiotice, ninguém pode atingir a verdade pela discussão. Todas as discussões são uma grande perda de tempo, porque provocam um clima no qual qualquer entendimento entre duas ou mais pessoas se torna insuportável, onde qualquer coisa dita é sempre mal interpretada. Uma mente que está disposta a vencer, a conquistar, não consegue compreender nada. Isso é impossível porque a compreensão necessita de uma mente tranqüila e não violenta. E quando você está lutando pela vitória, você tem, obrigatoriamente, que ser violento.
Discutir é um ato de violência. Através dele você pode até matar, mas nunca ressuscitar. Através dele você pode até aleijar, mas nunca curar. Através dele a verdade, pode ser assassinada, mas nunca recuperada. O debate é sempre violento. Nele, sua própria atitude é sempre violenta. Na verdade você não está em busca da verdade, está em busca da vitória, seja por uma argumentação mais lógica, por uma erudição maior, ou ainda pela força física ou status. Quando a vitória é a meta, a verdade é sacrificada. Quando a verdade é a meta, você pode sacrificar a vitória.

Apenas a verdade pode ser a meta; a vitória não. Quando a vitória é a meta você se torna um político. Você fica agressivo, está sempre tentando vencer o outro, esta sempre tentando dominar e tiranizar de todos os modos possíveis. A verdade não pode nunca se transformar em dominação, não pode nunca destruir.
A verdade não pode ser uma vitória, quando essa abstrata vitória significa derrotar alguém. A verdade trás humildade, modéstia. Não uma viagem em prol de sua vaidade, de seu orgulho, do seu ego, como o são todas as brigas. A briga nunca conduz ao real; sempre caminha para o ilusório, para o não verdadeiro, porque a própria sensação de vitória é estúpida! Verdade significa nem “eu” nem “você”, na discussão, ou eu venço ou você vence; a verdade mesmo nunca é vencedora.

Aqueles que estão realmente na busca permitem que a verdade vença a ambos, enquanto que os competidores esperam que a vitória pertença apenas a si mesmos, não aos outros. Entretanto, os outros não existem. Na “verdade” nós nos encontramos e nos tornamos “um”. Assim quem pode ser o vencedor? Quem pode ser o vencido? Na realidade ninguém é vencido ou vencedor.
Como você pode entender o seu oponente se você está contra ele? O entendimento é impossível. O entendimento necessita de simpatia, de participação, de calma, de serenidade. Entender significa ouvir o outro totalmente. Ao discutir, debater, argumentar, racionalizar, você não ouve o outro, apenas finge ouvir e, interiormente, fica se preparando. Por dentro, você está se armando para a próxima jogada pronto para rebater, quando o outro parar.

Na briga a verdade não é significativa. Por isso a comunhão nunca acontece; você pode argumentar, e quanto mais argumentar, mais se separará do outro. Quanto mais discutir, maior será a separação, até tornar-se um enorme abismo.

Verdade significa simpatia; verdade significa não argumentar. Você veio para ouvir, para buscar a verdade, não para discutir, você veio para entender, não para vencer. Você não veio para ganhar, pelo contrário está pronto para perder.

ela lógica, pela argumentação, pelo conhecimento, as pessoas tornam-se alheias uma as outras, tornam-se estranhos. Como você pode achar a verdade se não consegue entender o oponente, se não é capaz de nem mesmo ouvi-lo, se a sua mente por dentro, continua brigando, discutindo? Você é violento e essa agressão não o ajudará. Todas as brigas são fúteis, nunca levam a nada.

Quando você vence com a verdade, seu oponente não é derrotado, a verdade foi quem venceu, e o outro fica feliz. Ele se sente vitorioso com sua vitória, ele participa. Está não é uma vitória sua, a verdade venceu e, ambos podem celebrar. Mas quando você derrota uma pessoa, ela nunca é vencida. Permanece inimiga. No íntimo, fica esperando pelo momento certo de reivindicar seus direitos, de correr atrás do prejuízo.

A menos que você se unifique com a vida, nunca poderá conhecer a verdade. A unificação com a vida só acontece dentro de você. Não existe nenhuma maneira de conhece-la do lado de fora. Você pode andar o mundo todo, rodar de um lado para o outro, mas nunca descobrirá a verdade. Ela está dentro e não fora.

A vida não é um problema. Se você estiver tentando resolve-la, não a compreenderá. A porta da verdade
está aberta, nunca esteve fechada. Se a porta estivesse fechada, os cientistas, os políticos e os brigões de plantão encontrariam uma maneira de fabricar a chave.

A vida não é um enigma para ser resolvido, é um mistério para ser vivido, hoje aqui e agora. Nenhum tipo de briga pode ser de alguma ajuda; nem com os outros nem consigo próprio.
Quando você procura briga, você a encontra. Mesmo que ninguém o insulte, mesmo que ninguém queira brigar, você a encontra. Então não as procure, caso contrário as encontrará em todo lugar que vá. Por exemplo: De repente alguém ri, não de você, quem afinal é você? Por que você pensa que tudo é com você?

Você apenas está apenas passando e, então alguém ri; logo você pensa que estão rindo de você. Porque de você? Quem você pensa que é? Você é o ilustre quem? Se alguém ri, está rindo de você? Alguém xinga, está xingando você? Alguém está com raiva, está com raiva de você? Ora! Tenha paciência, se toca, você não é tão importante assim.

Toda essa paranóia está dentro de você. Você é que é brigão, violento, prepotente, presunçoso e arrogante. Você não pode criar a arrogância, se ela não estiver lá dentro. Você não pode botar para fora a prepotência se ela não estiver lá dentro. Quando se vira um copo o que está dentro cai. Quando alguém ri você pensa que é de você. Você é o problema não aquele que ri. Você é que está carregando a raiva, ele é a penas o pretexto, se não for ele será outro, qualquer outro. Ninguém lhe faz nada, você é que se faz. É a sua história interna, o conteúdo do seu copo, que sai para fora. É o transbordar do que você está cheio.

Uma semente cai no solo, germina, e uma árvore começa a crescer. O solo, o ar, a água o sol estão dando a oportunidade. Mas a árvore já estava escondida na semente. Você carrega a árvore inteira dentro de você e, os outros apenas lhe dão a oportunidade de germinar. Agora se sua árvore é um cactus todo retorcido, feio, cabeludo, cheio de espinhos venenosos, ou uma linda flor que a todos encanta e conquista, depende do que tem dentro de você.

Quando algo acontecer, não olhe para fora, não ache que a culpa é dos outros, olhe para dentro, porque seja lá o que esteja acontecendo, tem a ver com você, somente com você, ninguém tem nada com isso. Não se esqueça que a rudeza, a dureza, a grossura e a ignorância sempre perdem, tanto que os dentes caem e a língua fica.

“Na história da teimosia, entre a rudeza e a arrogância,
É tão forte a ignorância, tão cruenta, tão mordaz,
Que a própria sabedoria de tudo sabendo tanto,
Não pode saber de quanto o ignorante é capaz”

Lembre-se do ditado: “Quando o arqueiro erra o alvo, não procura o defeito na flecha, no arco, no vento ou no alvo, procura o defeito em si próprio”.
“Realmente vitorioso não é quem vence em batalhas milhares de homens, mas sim, quem a si mesmo vence.”
Dhammapada - ves. 103 - Séc. lll a.C.

Desejo que todas as coisas boas fluam para vocês, que os perigos não os alcancem, que nenhum mal os atinja, que todos possam ser felizes, saudáveis e com longa vida.

Na paz de Budha

A Canção das metades

A CANÇÃO DAS METADES


Creio já ter atravessado a metade ou o meio desta vida flutuante onde o vasto vazio é soberano.
Meio ..., metade ..., pequenas palavras tão cheias de significados ocultos. Nesta vida em que alternamos sofrimentos e alegrias em doses homogêneas, de que nos adianta tentar provar das alegrias ou tristezas, além das que podemos ter.

A metade da vida é a melhor fase, o período mais interessante que alguém pode querer chegar. Aquele que sabe andar vigilante, devagar, calmo e sem pressa, obterá um vasto mundo entre o céu e a terra.
Moro há meia distância entre a montanhas e o mar. Sou meio intelectual e meio desligado, meio elegante porem desarrumado. Vivo em meio aos que tem posses, mas dirijo meus parcos esforços para o bem do povo simples e carente. Minha sua casa é adornada, porém meio simples. Não é pequena nem grande demais e, apesar de possuir bons móveis, parece meio nua e vazia.
Minhas refeições são triviais, simples, mas bem elaboradas por uma nutricionista. Tenho uma empregada evangélica, que compreende o Zen Budismo mais que muitos praticantes que conheço, não é astuta nem muito estúpida. Fala quando pode e finge que entendeu o que não tem a menor idéia do que seja.
Casei com mulher não muito feia nem bela em excesso, que não gasta muito nem é excessivamente econômica, que usa sapatos altos, mas só para sair, nunca em casa.
Seguindo assim minha vida, sinto que sou meio Budha meio homem, não sendo nada completo, nem faltando muita coisa, sou bom pai e esposo razoável. Praticante sincero e meio desapegado.
A metade do que sou entrego ao Budha, a outra metade deixo para quem quiser.
Meio pensando no que seria o correto a ser feito, meio preocupado em como pagar as contas que teimam em crescer, meio pensando em prover para a posteridade e, meio tentando responder e corresponder a quem de mim solicita.
Não muito feio, nem belo em demasia, não muito alto nem baixo demais, nem forte nem fraco, nem magro nem gordo, nem pobre nem rico, nem isso nem aquilo.
Pois, é melhor bebedor quem só meio ébrio fica. A flor a se entreabrir mais linda se revela. Mais firme é o navegar do barco à meia vela. Melhor trota o cavalo de rédeas meio presas. Melhor se senta em zazen quem não tenta impressionar com sua postura perfeitamente ereta. Melhor é comer um pavê sem culpa, porém só meio pedaço. Mais bonito que olhar o dia ou a noite e vê-lo nascer e se pôr. Melhor que ver o mestre partindo é saber que já voltou.
Quem tem meios demais sofre de muita ansiedade. Quem não os tem, deles precisa.
Como a vida se faz de doçura e amargor de alegrias e tristezas, de amor e desamor, de sim e de não, quem só a metade experimenta e prova é mais inteligente e sábio.

 

Á Noite.

À NOITE


Chega em casa, cansado da labuta, da faina diária, encontra-se com a família, beija a mulher que mal levanta os olhos das unhas a serem aparadas, beija o filho, que por um instante esboça um leve esgar de satisfação, logo obscurecido pelo ribombar dos socos e chutes do “Dragobol Z” que ele assiste na tv a cabo. Quantos não repetem diariamente esses gestos sem emoção, quantos atos efetuados apenas por costume.

Alheio ao burburinho exterior, como é costume queda-se silencioso, em paz no lugar onde os mundos não se distanciam. Está só, sempre esteve, sozinho em meio as imensas forças do cotidiano que neste momento se calam e se aquietam no interior de si mesmo.


Algumas marcas invisíveis ainda doem do esforço do dia, ele observa seu corpo sem muito interesse, não consegue perceber as muitas marcas tatuadas pelas agruras de viver, a não ser aquelas relativas ao tempo. Sente a dor, aquela que não dói, que não marca, que não deixa seqüelas visíveis.


Ri da não mais tão estranha dimensão do sofrimento humano. Sorri, um sorriso amarelo pelo tempo perdido em que ainda não enxergava, mas percebe claramente que a dor ainda reverbera, que ainda ressoa, e se queda espantado pelos traços ainda não totalmente apagados do medo, do cansaço, da desesperança e da sensação de solidão e escuro. Como uma criança assustada pelos terrores da longa e escura noite, senta-se na almofada de meditação.


Ao longo do meditar... lembra-se daquele que há tantos meses trabalha sem receber salário, daquele que se esforça para entender o que não faz sentido, daquele que ganha muito para fazer pouco, daquela que tem que se virar em duas para poder criar os filhos e praticar, de outra ainda um pouco confusa, um pouco perturbada em meio a escolhas incorretas efetuadas na vida, de outro ainda que quase se afoga em meio a tantos rituais e sistemas que criou para se sentir seguro. Lembra de tantos que passaram, que estão passando, afinal tudo é como uma repetição quase enfadonha, uma estrofe repetida dia-a-dia, ano após ano. Ainda escuto o recitar de alguém efetuado sem muita convicção, sem muita segurança, como que preocupada com que pensarão, caso ela erre. E daí se errar, afinal para que uns se aprovem outros devem ser reprovados. Percebo a sensibilidade começando a ser manifestar, pela retirada dos destroços, pelo apaziguar dos apegos, pelo amenizar dos desejos.


Conhece o caminho. Sentado sem pressa, sem medo, sem incômodo. Conhece o caminho, já passou por ele, lembra-se ainda dos percalços da estrada, dos buracos, das armadilhas, das imagens transbordantes, muitas vezes também escutou os lamentos, também deu o gripo que ficou parado no ar.


Recorda-se da imagem do altar, e pensa que talvez não devesse existir esse altar, um altar, qualquer altar, mas abre a metáfora de “depois” tão incômodo, virulento e inconstante, que é melhor remetê-lo para um simples e verdadeiro aqui-e-agora... Tem a mais absoluta certeza de que somente agora haverá descanso, paz. Para que descansar do longo dia, por que precisa adormecer, por que desligar-se, não precisa, a meditação por si só é bastante suficiente.


Permanece em silêncio, os gritos fantásticos de outrora já não lhe rondam a mente, não mais escuta o gemer oriundo do vale de lágrimas da civilização perdida de si mesmo.


Permanece em silêncio, pensa no apocalipse possível pelo acúmulo da dor e da infelicidade das vidas esmagadas pela desesperança e pela ilusão.


Lentamente respira, profundamente aspira com o seu inspirar todo o universo. Sereno ele busca, no único lugar onde sabe poder encontrar, procura no centro do “agora” a “luz”. Seus olhos vagueiam despreocupados pela parede marcada com as mãos e pés de seu filho bagunceiro. Percebe os intuitos egocêntricos, relaxa na sua imóvel solidão por todos acompanhada, respira em paz e se identifica com a dor de todos, ainda se lembra da angústia de existir em um mundo onde as escolhas a que somos obrigados a fazer nos jogam dentro do caldeirão onde estão misturados em doses abundantes a ganância, a raiva e a ignorância.


Respira... Quieto em si... Renova seu voluntário sacerdócio, seus votos de ensinar o verdadeiro caminho para a comunidade que acompanha, para aqueles que buscam... Tenta se lembrar em como chegou até este ponto, sofrendo, doído, trôpego, ferido... (até rimou) das chagas abertas, das dúvidas, da sensação de ter sido continuamente vencido, da humildade aprendida em meio as sucessivas falhas. Dos erros, dos castigos ou o medo de sofrê-los... Dos limites atuais de suas ações, do tatear, do buscar novas maneiras, novos métodos, da percepção aguda dos limites que o cercam. Como é natural, também se lembra dos sucessos, das vidas que desabrocham em um cântico de louvor a si mesmas... Da expressão de beatitude resgatada, da alegria e da felicidade manifestada.


Lembra de muitos colegas, materialistas de carteirinha, perdidos e aprisionados em suas irreais construções mentais, alheios inteiramente à verdade que bate em suas portas, que se encontra na frente de seus narizes empertigados e empoados de tanta arrogância, de tamanha prepotência e enorme estupidez, alheios inteiramente de si mesmos e de suas enormes possibilidades.


Terminando sua meditação noturna o homem olha o ilusório mundo formado pelos erros repetidos incansavelmente pelos imbecis, pelos idiotas, pelos fanáticos religiosos, pelos preconceituosos de plantão semi-ocultos nas esquinas e escadas da vida, pela vã tentativa de nos sentirmos diversos dos desfavorecidos, dos habitantes dos guetos, dos diferentes, dos opostos. Relembra-se do medo que tinha do mal, do profundo mal subjacente ao gênero humano, da latente destrutividade, das veladas e temíveis intenções escondidas no recôndido do coração dos homens.


Finaliza a sessão, respira profundamente, calmo, renovado... só, mas totalmente unido a todos.


Balança-se de um lado para o outro, desfaz a postura, levanta-se, efetua uma leve mesura para a querida almofada que sempre o recebe tão carinhosamente.


Em seus lábios há um que de abandono infantil.


Amanhã... me esforçarei mais...


O amanhã não existe... me esforçarei hoje.